Na caiação de tinta que uma parede espera, há toda uma estória pregressa de quadros ausentes, de janelas fechadas, de papéis de paredes desbotadas.
A tinta renovará o lugar para uma nova relação sócio-espacial, um novo olhar de um outro morador ali existirá como forma de ser novamente. O exercício da memória ou lembrança se dá por um desbotar de tintas pessoais, não que se apaguem, mas esmaecem pelo andar do presente que aciona uma presença constante do olhar futuro.
Nesta caiação entre o preparo da nova tinta e o tirar da tinta anterior que se faz as narrativas do livro “O que não existe mais” de Krishna Monteiro. Relações entre tintas temporais no presente e no passado acontecem no primeiro conto que dá nome ao livro, onde o narrador sente a presença de seu pai não como um elemento interrogador, mas sim de fundo contemplativo ali naquela estante de livros, absorto em vê-los.
Pela narração de Krishna, os tempos narrativos se fundem numa única ação que é fusão de um tempo fundido entre a memória do filho e sua percepção do pai, como uma reconciliação do já ter sido.
No conto “Num âmbito cerrado como sonho”, narrado por um felino, um encontro fugidio entre dois amantes que se encontram num quarto. Um gato percorrendo os espaços do recinto, sendo uma testemunha do romance entre o homem e a mulher. Aqui a narração do escritor cria lapsos de ação onde os espaços narrativos ora se concentram, ora se esfumaçam em elipses de tintas temporais.
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