Em 20 de Abril de 2010 a Fox exibiu o décimo-quinto episódio de Glee. Em The Power of Madonna, pela primeira vez, tivemos um episódio inteiro dedicado à obra de um único artista, e a série musical de Ryan Murphy atingiu um novo patamar, entrando de vez na cultura pop a que, a príncipio, só homenageava.
O que é Glee? Uma série sobre os losers de uma High School de Ohio, com cheerleaders, quarterbacks, bullying, humor exagerado e músicas mais do que conhecidas sendo cantadas em versões nem sempre melhoradas. Então por que esse fenômeno? Timing. A série é bem escrita, diverte e, sabendo seu lugar, presta homenagem à música pop sem se levar tão à sério. Mas a grande sacada de Ryan Murphy talvez esteja no público, por que a geração que assiste Glee é essa geração que consome tudo muito rapidamente, recicla e usa de novo, prestando homenagem ao que sentiu na primeira vez em que consumiu aquilo.
Confuso? Quando The Power of Madonna foi exibido, chegou as lojas o CD contendo as 7 canções de Madonna regravadas pelos estudantes do “New Directions”. O álbum foi o primeiro da série a chegar ao número 01 na lista da Billboard (roubando o lugar do ídolo teen Justin Bieber), e tanto as versões da série quanto as músicas originais de Madonna tiveram um aumento no volume de downloads no iTunes.
O sucesso do episódio, aprovado pela própria Madonna, fez com que uma enxurrada de fãs clamasse por especiais de seus ídolos de um lado, enquanto uma penca de artistas se diziam honrados em serem considerados para tal de outro. A escolhida de Murphy foi a princesinha do pop, Britney Spears, e muito por causa da comoção em torno da produção do episódio, com sites de fofoca revelando fotos do set, a notícia de uma participação da cantora e muita boataria no Twitter, o tributo à Britney fez mais barulho que o de Madonna.
Brittany/Britney foi exibido em 28 de setembro de 2010 e se tornou o episódio de maior sucesso da série até hoje, com 13,3 milhões de espectadores nos Estados Unidos. O número representa um aumento de 4% sobre a audiência da Season Premiére exibida uma semana antes, e desde Seinfeld em 1993 que uma série não batia recorde de audiência no início da temporada, só para quebrar o recorde na semana seguinte.
A crítica mais recorrente ao episódio é que deveria ter incluído mais números musicais, mas em geral o sentimento é de aprovação. A filosofia-mor de Glee é que custa caro “ser você mesmo”, mas que vale a pena ter personalidade e enfrentar as adversidades. Esse foi o mote de Brittany/Britney, que mostrou como a história de crise e renascimento de Britney pode servir de alerta e inspiração para seus fãs. Assim como Mr. Schu, nem todos os pais concordaram com isso, e o Parents Television Council divulgou um protesto onde reclamava:
“Talvez o maior problema seja transformar uma popstar problemática num símbolo de poder e auto-estima. Considerando suas passagens por clínicas de reabilitação, seus ataques altamente noticiados e suas questionáveis habilidades como mãe, não há absolutamente como Spears ser considerada um modelo a ser seguido. Os produtores da série podem nos poupar da cantilena sobre celebridades decaídas dando a volta por cima.”
Na fase atual do mercado fonográfico, o licenciamento é uma das poucas saídas lucrativas (junto das performances ao vivo), por isso interessa tanto a artistas como Madonna e Britney que seus sucessos sejam reciclados pelos garotos da McKinley High. A resposta ao episódio de Britney veio de fãs que cresceram com a cantora, gente que a ouvia aos 15 e agora está com 25 anos, no máximo 30. Todo mundo tem direito a nostalgia, mas os dez anos de carreira de Britney não são algo tão distante para justificar a comoção, mesmo com o seu impacto na cultura pop. A questão volta ao consumo. Independente de sua qualidade, Britney está aí, há dez anos, como uma estrela de sucesso. Só isso já é uma conquista e tanto. Madonna, que acima de tudo é incrivelmente inteligente, está sempre se renovando, sempre conquistando mais público e sempre ligada ao que está na moda. É por isso que as duas foram tão perfeitas para os episódios especiais da série. A resposta positiva aos dois episódios fez com que Ryan Murphy fosse pressionado a repetir a dose (sim, tanto com uma diva, quanto com a outra). Ele não confirma as especulações, mas sabe-se que outros tributos virão. Há planos para um episódio dedicado a Michael Jackson e o blogueiro Perez Hilton usou o Twitter (tão eficaz no caso de Britney), para pedir um especial das Spice Girls!
Apesar de algumas críticas, um dos maiores méritos de Glee é mostrar a obra de artistas relevantes para adolescentes que dificilmente resolveriam estudar a história dos musicais, o repertório de Barbra Streisand ou o estilo de Bob Fosse. No próximo dia 26, vai ao ar o episódio de Halloween em homenagem a “The Rocky Horror Show“. Mais uma vez, a expectativa da mídia é grande e há a promessa de uma nova leva de fãs para a peça dos anos 70, além é claro de aumento na procura pela trilha sonora e o DVD do filme.
E é assim que, sem grandes pretensões dramáticas, Glee continua a crescer. Mastigando a cultura pop, engolindo e regurgitando, como o “monstro da fama” citado pelo maior ícone dessa geração, a diva que usa a própria cultura pop como propulsor e espelho de seu (enorme) talento: Lady Gaga. Gaga, aliás, que já foi homenageada em Glee, embora seu episódio tenha sido meio fraco… talvez por que sua filosofia (e algumas de suas músicas) estão na série como um todo.
Glee é Deus.
Amém.
Fazendo referências ou homenagens à cultura pop, Glee consegue ir longe. Espero que a formula não se esgote. Mas achei o ep. da Britney muito falado e nem foi tão bom assim. Olha que amo Miss Spears.
Pois é, o impressionante sobre o episódio, como fenômeno pop mesmo, é que graças ao burburinho antes e depois (especialmente no Twitter), ele tomou proporções épicas muito maiores do que o merecido, embora a própria campanha da FOX o anunciasse como o maior evento de Glee EVER! Mas no fim, muito pelas escolhas do roteiro (a loucura da anestesia), não foi essa Coca-Cola toda.
Mas até tenho esperança de um segundo mais legal. Sobre o esgotamento de Glee, ainda há fôlego para muita coisa, mas não é uma série que vai durar dez anos…