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“Shippados” prova que Fernanda Young e Alexandre Machado são atemporais

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Não subestime um texto de Fernanda Young e Alexandre Machado. Claro que o fato do casal ter sido tão certeiro no primeiro grande fruto televisivo, Os Normais, se transformando num dos símbolos da cultura Pop dos anos 2000, aumentou muito as expectativas dos trabalhos posteriores.

Por mais problemas que O Dentista Mascarado que tenha tido, produções como Separação?!, Minha Nada Mole Vida e O Sistema acabaram subestimadas, menos pelo texto bem urdido da dupla, e mais pela procura de um hype que só a genial série do casal ordinário Rui e Vani conseguiu manter. Eis que numa verdadeira revolução do consumo de conteúdo atual, eles entregam, direto na plataforma de streaming Globoplay, o ótimo Shippados.

Do nome ao universo ao qual o casal está atrelado, a produção se inspira nas relações modernas, construídas e extraídas do mundo virtual. Rita (Tatá Werneck) e Enzo (Eduardo Sterblitch) são dois jovens solitários com problemas e carências afetivas e profissionais.

Os dois se conhecem por acaso, após um mal sucedido encontro de aplicativo e dão “match” exatamente por suas inadequações e maneirismos (ela tem um trauma de infância que a emperra e ele não sabe lidar com sua própria personalidade). Young e Machado continuam muito hábeis em ressignificar as paranoias de um relacionamento, sobretudo pelos códigos dos tempos modernos, com seus gadgets e onisciência tecnológica. Os diálogos são precisos e numa dinâmica tão própria, que é rapidamente reconhecível o talento dessa dupla em tornar comum e assimilável os mais absurdos recortes dessa relação.

A direção de Patrícia Pedrosa é muito competente. Ela imprime uma atemporalidade charmosa, com ares vintages e um prisma de um Rio de Janeiro mais cinza, mais centro da cidade, geralmente nublado, num trabalho de cores e fotografia muito bem pensado. Assim como a trilha, com pérolas do indie brasuca de O Terno a Rubel.

Tata e Sterblitch estão brilhantes agregando humanidade a suas conhecidas personas cômicas. Aliás, todo o elenco está muito bom: Luís Lobianco, Clarisse Falcão, Júlia Rabello, Rafael Queiroga e Yara de Novaes são presenteados com personagens ótimos. E compreendem bem isso.

Shippados é uma série nacional fora da média do que se faz por aqui. E é muito bom ver como o casal criador continua trabalhando bem a fixação cínica nas intimidades das relações, sobretudo nos esquizofrênicos dias de hoje. O primeiro episódio não é tão bom quanto os demais (o segundo, com a cena da ameaça de suicídio é hilário), e após os episódios da viagem em grupo para Maricá, onde se desenrola uma questão importante na vida do casal, a série perde um pouco do fôlego, comprovando que não eram necessários mais que 10 episódios. Mesmo assim, configura-se, ao lado de Sob Pressão, como a melhor produção original do canal de streaming.

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