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“Arigós – Bandeira, Espinha-de-Peixe, Cara-de-Gato” no Centro Cultural São Paulo

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Arigós, pássaros migratórios, foi o apelido dado aos soldados da borracha que chegaram aos bandos em terras amazônicas nos anos da segunda grande guerra.

Com dramaturgia elaborada a partir dos textos amazônicos de Euclides da Cunha e nas histórias e depoimentos de homens e mulheres ribeirinhos, descendentes dos Arigós e que hoje são também povos da floresta, a Cia. Mundu Rodá adentra o universo amazônico no rasto da borracha no espetáculo “ARIGÓS – Bandeira, Espinha de Peixe, Cara de Gato”, que estreia em curta temporada no CCSP, de 19/3 a 05/4.

Entre 1942 e 1945, por força dos “Acordos de Washington” assinados por Brasil e Estados Unidos, cerca de sessenta mil “soldados da borracha” foram compulsoriamente recrutados e enviados para os seringais amazônicos pelo governo brasileiro. Calcula-se que metade morreu, graças ao descaso com que foram tratados pelos órgãos oficiais ou na dura labuta dos seringais.

Embora muitos exploradores e viajantes tivessem adentrado o território, até então denominado erroneamente de deserto demográfico, apagando intencionalmente a existência de diversos povos originários que o habitavam, a exploração da borracha foi a primeira grande ferida aberta na Amazônia, construiu cidades e a riquezas de alguns, morte e miséria para outros tantos, esquecidos e apagados da História.

“Para descrever o transcurso migratório dos Arigós, como eram conhecidos os soldados da borracha, o dramaturgo Murilo De Paula elege a imagem “do assado para o cozido” aludindo à célebre obra de Lévi-Strauss, O cru e o cozido. Essa síntese satírica condensa o percurso e a transformação desses homens e mulheres sequestrados, instalados, acolhidos e deglutidos na e pela floresta.

O cru e o cozido reúne mitos ameríndios que narram o roubo do fogo pelos seres humanos, geralmente de um animal: arara, onça, etc. Em posse do fogo, a humanidade passa a cozinhar, deixam de comer cru, distinguindo-se assim do restante dos seres. Esse ato mítico delineia a oposição entre natureza e cultura, animalidade e humanidade. Os Arigós, que sobreviveram no curso de algumas décadas e se aclimataram na floresta, nos sugerem poeticamente, ainda que produzido pela violência do Estado, um movimento inverso ao mito: de embate, confronto e, quiçá, ainda nessas condições, de fusão, de retorno à natureza”, diz o diretor Antonio Salvador.

O espetáculo é composto por três movimentos: bandeira, cara-de-gato e espinha-de-peixe, nomes dos veios, grafismos que os seringueiros cortam nas árvores para que o látex escorra e seja coletado.

“Os contos e ensaios que compõem a inacabada obra Euclidiana sobre a Amazônia, reunidos em À margem da história e, posteriormente, em Um paraíso perdido, já nos apresentam esse teatro de dimensões além-humanas: “nunca se armou um cenário tão imponente para tão pequeninos atores”. É nesses termos que Euclides convoca a floresta como protagonista desse drama cosmogônico. A Hileia – em grego, “floresta virgem” – já aparecia nos escritos das expedições exploratórias de Francisco de Orellana (1540-1542), Humboldt (1808) e de outros estrangeiros, como ente formada por seres plurais e dotada de intencionalidades próprias, que não necessariamente humanas” , acrescenta Antonio.

Para a Mundu Rodá o espetáculo é um deslocamento do universo cultural nordestino – campo de trabalhado cultivado pela Cia. há 20 anos – rumo a floresta Amazônica. Neste processo a Cia. realizou duas pesquisas de campo: a primeira em 2017 para a região do Médio Xingu (Pará) nos seringais amazônicos, em 17 comunidades extrativistas nas RESEX Rio Iriri e Riozinho do Anfrísio, e na Terra Indígena (TI) Cachoeira Seca – Arara do Iriri | Terra do Meio; e a segunda em 2019 para o Acre na Reserva Extrativista Chico Mendes e nos municípios de Xapuri, Rio Branco, Brasiléia, Epitaciolândia, Assis Brasil e Cobija (Bolívia).

Serviço

ARIGÓS – Bandeira, Espinha de Peixe, Cara de Gato
Centro Cultural São Paulo
Rua Vergueiro, 1000
Espaço Cênico Ademar Guerra
Capacidade: 80 espectadores
Quintas, sextas e sábados às 21h, domingos, às 18h
90min
14 anos
De 19/03 a 05/04
R$ 20,00 – a bilheteria será aberta duas horas antes do início do espetáculo para a retirada de ingressos

Ficha Técnica

Concepção e atuação – Alício Amaral e Juliana Pardo
Direção – Antonio Salvador
Dramaturgia – Murilo de Paula
Direção Musical – Alício Amaral
Desenho de Luz – Eduardo Albergaria
Cenário – Eliseu Weide e Cia. Mundu Rod
Figurino – Eliseu Weide e Mila Reily
Direção de Movimento – Lu Favoreto e Juliana Pardo
Preparação Corporal – Lu favoretto
Musicista – Amanda Martins
Coordenação Dramatúrgica – Luís Alberto de Abreu e Maria Thaís
Operação de Luz e Cenotecnia – Eduardo Albergaria e Felipe Stucchi
Produção – Mariana Pardo e Gessica Arjona

Sinopse

Arigós, pássaros migratórios, apelido por vezes pejorativo dado aos milhares de nordestinos atraídos para a Amazônia em campanhas para a extração do látex. Na segunda guerra, ludibriados com a alcunha de “soldados da borracha”, foram abandonados nos seringais em condição trágica. O espetáculo encena o deslocamento, o confronto e a aclimatação dos que hoje são também povos da floresta e ribeirinhos. Textos da obra inacabada de Euclides da Cunha sobre a Amazônia, como Judas-Asvero, integram o espetáculo.

Histórico da Cia.

Ao longo do tempo, a Cia. Mundu Rodá (criada em 2000) construiu uma trajetória artística marcada pelo diálogo entre o trabalho do ator/bailarino/músico e as manifestações tradicionais, sempre em busca de uma expressão artística contemporânea capaz de revelar os traços e os fundamentos da natureza da cultura brasileira.

Nas criações realizadas, assim como na vasta atuação formativa desenvolvida por seus fundadores, Juliana Pardo e Alicio Amaral, a Cia. busca incorporar muito mais do que as informações mais evidentes das formas populares. Seus trabalhos procuram os fundamentos mais primordiais da corporeidade brasileira, marcada pelo encontro de povos de origens distintas, apoiada em uma cultura fundamentalmente oral na qual a pluralidade rítmica transborda um modo de viver que não estabelece limites rígidos entre brincadeira, expressão, formação, crença e arte. Buscam conexões com as mensagens deixadas pelos povos, através de gerações, e narram cenicamente histórias pouco ouvidas até agora.

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