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Crítica de Birdman, ou “A inesperada virtude da ignorância”

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Assistir Birdman foi como passar por uma brisa de água fresca em meio à onda de calor. Explico: Birdman é um filme diferente, que consegue se destacar de todos aqueles que tenho visto no cinema hollywoodiano. Desde os primeiros minutos até o final, a maneira como ele se organiza me surpreendeu.

Todo o ritmo da narrativa parece seguir o descompasso melódico do jazz improvisado que acompanha o filme como trilha sonora, por vezes diegética e por outras, não diegeticamente. A maneira como os personagens são apresentados e como a história vai seguindo seu fluxo são complementadas e não suprimidas pela câmera viajante que nunca para em seu quase permanente e inebriante plano sequência. Toda essa forma (fotografia, movimento, trilha sonora) marcante poderia ter oprimido a história e os personagens tornando-se mais presente e em destaque que os outros elementos, mas realmente funciona de maneira a apenas acrescentar.

Em alguns momentos, sinto como se estivesse assistindo um filme dos anos 40 ou 50, onde a narrativa era levada pelos personagens, em que suas pequenas idiossincrasias construíam o caminho que seria seguido pelos espectadores. Aonde os conflitos humanos em conjunção a um pensamento sagaz do diretor construíam uma história divertida que sabia permear os caminhos do drama e da comédia ao mesmo tempo.

É estranho, por mais megalomaníaco que o filme possa parecer em suas escolhas estéticas, a sensação que passa é de simplicidade, de um mini universo que consegue através de sua peculiaridade, atingir muitos outros universos.

Fico muito feliz de finalmente ter visto um filme do diretor mexicano Iñárritu que não esteja tentando resumir os problemas de todo um planeta ou de todo um país em algumas histórias que se entrelaçam. Que sua vontade de atingir as complexidades do escopo de emoções humanas não o tenha levado a forçar a mão em uma narrativa pesada e que se propõe a discutir muito mais do que é capaz. E também, que tenha se deixado levar por uma narrativa fantástica, que não precisa de explicações, que capta a platéia por sua força natural, por ser uma história bem contada, com personagens fortes interpretados por ótimo atores que prendem sua atenção e respiração, que são cativantes e não apenas instrumentos para passar uma determinada mensagem.

Em termos práticos, Birdman narra a história de um ator de Hollywood, que há quase 20 anos, fez parte de uma bem sucedida franquia de filmes de super heróis e que agora está tentando voltar às graças da fama e da crítica ao investir todo seu dinheiro em uma peça séria na Broadway inspirada em um bem conhecido escritor de dramas. Ele está tentando se estabelecer como um ator de talento que merece respeito e foge constantemente à tentação de aceitar fazer um terceiro filme da franquia, decisão essa que lhe traria a fama imediata com a qual tanto sonha, mas sem a dose de respeito por seu trabalho sério como ator. Essa dualidade o acompanha durante toda a narrativa, sobretudo nos momentos de maior frustração ou adversidade.

E finalmente, outro ponto que me surpreendeu favoravelmente no filme foi seu senso de humor, pois por mais que esteja criticando o mundo do entretenimento, está também abrindo brechas para a alegria e para a ambiguidade dos sentimentos que todos nós carregamos em nosso dia a dia.

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