Há um tempo que é a mistura de uma região agreste onde o posso vem de um poço de águas fundas e límpidas. Do recorte do avô descascando uma laranja com um canivete suíço. Um tempo buliçoso cuja preguiça não está em se ocupar de coisas, de afazeres, mas sim, de aproveitar o dia onde quer que se esteja, só pedindo para não dar asas à neurose, essa condição anti-poesis que não consegue juntar som e ritmo num poema.
Almar é um estado poético, mas também o espírito das singelezas do cotidiano. Tratar das palavras com seu estilingue preferido, acertando no alvo cintilações mais significantes. A poética de Silvia Camossa em seu livro Almar, (editora Reformatório) é um estudo sobre as superfícies em seu cerne de ver a passagem da vida, como rio tranquilo, ou um evento, por seu lado, sem responsabilidade quântica, colocando as situações que podem ser poeticamente avessas à uma lógica cotidiana naturalista, despossuída de cognição cartesiana.
Há um afeto por trocas no livro, enlaces apertados, em situações muito bem amarradas pela poeta, com relações familiares ou coloridas pelo afeto à arte. Como um vinil é a música, mas também, uma peça estética, um objeto de culto. E neste processo de culto a tantos submarinos amarelos, canções de zelo, as partículas elementares do gozo no processo de produzir arte. De elementar depois do uso constante de um livro; seu processo de individualização perante o coletivo, relacionado círculos em torno dele, um processo semântico de criar um vínculo com outras pessoas que são leitores, produtores, consumidores.
Silvia é tão antípoda a estas questões de comprometimento social e métodos matemáticos sobre o produzir poesia, que suscita o questionamento: quais relações são medidas, hoje, do que é produzido em esquema puramente de massa e mercantil? Depois de ler Silvia fico com a pureza das respostas das crianças.
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