Morrissey assume seu papel de porta-voz do inconformismo em novo disco

“Low In High School” é o novo disco de Morrissey e traz logo na capa uma de suas marcas registradas, a ojeriza à família real britânica. Vemos um garoto em frente ao portão do Palácio de Buckingham, com um machado na mão e um cartaz na outra onde se lê “axe the monarchy” (“dê com o machado na monarquia”, numa tradução livre). É o velho Morrissey, com sua língua ferina à la Oscar Wilde, apontando para mazelas e para a estupidez, refletindo frustrações. Só que aparentemente (ainda) mais raivoso e inconformado.

Esse clima de fúria fica evidente na música de abertura, a pesadona ‘My Love I’d Do Anything For You’. em que vocifera contra o status quo de modo geral, clamando revolução. Em um trecho ele diz “Weren’t we all/Born to mourn and to yawn at the occupations/That control/Every day of our lives we can’t live as we wish/Live as we wish, live as we wish”(Nós todos não/Nascemos para lamentar e bocejar nas ocupações/Que controlam/Todos os dias das nossas vidas não podemos viver como desejamos/Viver como desejamos, viver como desejamos). Com guitarras forrando a audição impiedosamente junto com bateria primal, lembra bastante algumas faixas de “Southpaw Grammar”, de 1995 e de “Ringleader of the Tormentors”, de 2006. E ainda conta com a sofisticação característica, que permeia o álbum.

As inferências (homo)eróticas também estão ali. Explícitas, em ‘In Your Lap’ e ‘When You Open Your Legs’ (que tem uma das mais belas melodias do disco), ou mais sutis como em ‘I Wish You Lonely’ e ‘Home is a Question Mark’. Já o niilismo wildeano pode ser ouvido em ‘Jack’s Only Happy When She’s Up on the Stage’, ‘Spent the Day in Bed’ e ‘Who’s Gonna Protect Us From the Police’.

Já a parte controversa desse trabalho fica por conta de sua homenagem a Israel, país conhecido por uma discutível política externa em relação aos vizinhos. Não é de hoje que Morrissey demonstra um posicionamento pró-Israel. Em 2012, ele realizou um show em Tel Aviv e, em um momento, agitou uma bandeira nacional. O artista já havia feito declarações e letras compreendidas como racistas (como ‘Irish Blood English Heart’, do álbum “You Are the Quarry”, de 2004). As faixas são ‘The Girl From Tel Aviv Who Wouldn’t Knee’ – referência a Etty Hillesum, uma judia holandesa morta em Auschwitz durante o holocausto – e a que fecha o álbum, que leva o nome do Estado judeu. Nessa, ele chega a dizer que os que criticam o país têm inveja.

Se é o velho Mozza de sempre, então qual é o mérito de “Low in High School”? Justamente trazer o que estamos acostumados a ouvir em sua discografia, só que com gostinho de novidade. Manter o discurso fazendo com que soe novo é uma tarefa tão louvável quanto a reinvenção. O ex-The Smiths está cantando como nunca (ou melhor, como sempre) e a veia letrista continua imbatível. Se não é o melhor dos últimos anos, mantém o selo de qualidade intacto, polêmicas à parte.

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