Cisne Negro, um dos mais discutidos filmes dos últimos tempos, pode ser analisado de forma simplista como uma nova interpretação de “O Lago dos Cisnes” de Tchaikowsky, porém, graças às imagens idealizadas pela produção e trazidas à vida pelo diretor Darren Aranofsky e o cinematógrafo Matthew Libatique, formam um filme à parte para quem aprecia a beleza dos detalhes que somente os grandes diretores conseguem traduzir ao público.
Desde o primeiro momento, se nota o grande uso de tonalidades frias em todos os cenários e figurino do filme. A idéia é sempre criar uma transposição do preto para o branco, usando tons de cinza e iluminação, para mostrar a transformação de Nina, de bailarina inocente (o cisne branco) à uma força auto destrutiva (o cisne negro). Grandes histórias no cinema se contam com grandes imagens, não no sentido de algo épico, mas no sentido de saber infundir no espectador a beleza da dor e sofrimento.
O filme todo é sobre obsessões, chegando ao ponto em que a perfeição se torna única saída. Para demonstrar isso, o uso de câmeras de mão, trêmulas, demonstram a ansiedade da protagonista e os caminhos tortuosos pelos quais ela passa. Seja vendo sua mãe desenhando e a idealizando em um quarto do apartamento, seja através de olhares invejosos das companheiras de grupo, enciumadas pelo tratamento recebido, Nina vive um estado de constante paranóia.
O uso da perspectiva de Nina em certos momentos ajuda a reforçar essa preocupação.
Ao mesmo tempo, a exposição mais clara se vê está no figurino das atrizes. Enquanto outras bailarinas quase sempre estão de preto ou cinza, Nina começa o filme de branco e rosa claro, numa auto-afirmação de pureza. Suas reações são como o de uma criança que não sabe como encarar o mundo, mas que para ver seus sonhos realizados, tem de passar por todas as fases do amadurecimento para descobrir o quão frio e sombrio o mundo é.
Nos momentos de pura luxúria a maioria dos diretores escolheria escurecer o ambiente para usar-se do jogo de sombras, mas Aranofsky resolve mostrar tudo abertamente, sem ser pornográfico ou explícito, reafirmando como os desejos de uma pessoa vivem claros em sua mente. Ali não havia lugar para se esconder, há apenas o desejo pelo prazer, que todos temos dentro de nós, mas alguns escondem por vergonha. Não deveria haver vergonha em se ter prazer e desejos.
Desilusão amorosa, descoberta do proibido, obsessão por ser algo diferente do que sempre foi, tudo isso em poucos dias. Tudo mostrado de forma a deixar o espectador sem qualquer forma de reação que não dor e pena. O Cisne Branco sofria enquanto um Cisne Negro triunfa em seu grande momento. Mostrar esta dança foi o maior espetáculo criado pelo cinematógrafo Matthew Libatique e pela atriz Natalie Portman. A beleza da transformação de Nina em Cisne Negro é pautada e mostrada aos poucos em todo filme. Aos poucos uma nova pessoa nasce e toma o lugar na inocente Nina. O foco da câmera destaca apenas no rosto e os detalhes da pele da atriz, com a câmera e a bailarina duelando, movendo-se em um balé frenético de encontro um ao outro, como alguém que precisa prestar atenção em cada detalhe, cada movimento da bailarina.
Os olhares são muito bem aproveitados para esta demonstração de transição, grande mérito de Natalie Portman e Mila Kunis, que possui grande facilidade de se expressar usando leves mudanças de olhos e sombrancelhas. A câmera em closes fechados ajuda ainda mais a expandir as expressões das atrizes.
No momento de maior intensidade, o que deveria ser considerado grotesco ou absurdo acaba por se tornar belo para o público da apresentação e para o espectador no cinema. É a estética sendo manipulada para aperfeiçoar os sentimentos e interpretações da dança como libertação. O esplendor de Nina como Cisne Negro acaba em um quase orgasmo diante da platéia, acariciando no pós-coito à Thomas, seu diretor e incentivador, ao lhe plantar um beijo de pura luxúria. Não há amor ali, apenas desejo.
No fim, apenas brilho e claridade. Nina havia voltado a ser ela mesma ou teria esta alcançado seu nirvana pessoal? O aspecto de transcender fica para cada um interpretar pois nem tudo em cinema deve ser explicado, especialmente quando trata-se de um filme com uma temática tão forte. Simplificar o belo seria destruir tudo que foi sendo, por mais irônico que possa ser, destruído no decorrer do filme. Explicar cada passo, cada detalhe seria displicente e de um esforço admirável, porém em vão.
[xrr rating=5/5]
Mto bom o artigo. Parabéns! 🙂
Eu adorei o filme e recomendo!
Belo filme, belo artigo.
Muito bom o filme!
E o artigo, um dos melhores que já li: bons comentários!
Recomendo!