O som não pode ser armazenado, já que ele por gosto gosta de se propagar. Mas através de uma flauta, o som vira círculo, rodeia a madeira do que é feito o pífaro. A arma do brincante de atirar projéteis pela zarabatana é a mesma do poeta que enfileira palavras sonoras dentro de uma cava e por ali sopra poemas, sopra versos com a malícia dos distraídos que brincam com as palavras, como se o discurso do enunciado fosse o dardo e não os dados.
No livro da poeta Anna Apolinário, Zarabatana, publicado pela Editora Patuá, um jogo logo é estabelecido com o leitor. Que a flauta-poema leve a vida pra flauta. Que o poema não seja objeto de conteúdo, não se sabe nunca que seta ou dardo numa assoprada, Anna virá com a força de uma alquimista circense.
Toda a sua linguagem poética está na dança de dentro da palavra contida pela cava da Zarabatana e a sua visualidade quando exposta no ar no meio do presencial caminho (na direção do corpo tanto da página, quanto do leitor que recebe estas pedrinhas sonoras em seus calcanhares-ouvidos de ouvinte poético.
Combinando erudição literária com a sonoridade dos versos e uma habilidade espantosa em costurar fios narrativos com a zarabatana que anarquiza o conjunto; que desestabiliza qualquer teor de unidade, de nomeação ou titulação, o livro de Anna é uma rede de signos artes\a\natos que priorizam mais a estética do fazer do que a ideia do que os define.
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