Fernanda Torres sempre foi uma atriz de recursos cênicos um tanto particulares. Existe um certa áurea cool em suas atuações e isso se aplica desde a comédia (com o clímax no inesquecível “Os Normais” ou mesmo na peça teatral “A Casa dos Budas Ditosos”) até o drama (segurando bem a personificação da mãe em “Casa de Areia”). Evidente que isso se estenderia por sua aventura pelo mundo das palavras, em crônicas entre o cinismo sadio e a percepção personalista nas páginas da revista Veja Rio.
Impulsionada por estímulos de gente como o escritor João Ubaldo Ribeiro e o editor da Companhia das Letras, Luiz Schwarcz, e partindo de um texto encomendado pelo diretor Fernando Meirelles, que pretendia adaptá-lo para TV, Fernanda gerou seu primeiro romance, intitulado de “Fim”, excelente título para a história de um grupo de cinco amigos cariocas que relembram momentos importantes de suas vidas: casamentos, separações, saudosismo, arrependimentos e uma série de outros sentimentos, dentro da crise e crepúsculo da terceira idade, numa Copacabana que cada vez mais se configura como uma quinta personagem.
Álvaro, que abre o livro, é um solitário atormentado pela velhice. Ciro é o eterno conquistador, abatido por um câncer. Sílvio não consegue largar o vício em drogas e sexo nem na velhice. Ribeiro é um sujeito atlético, que apelou à medicina para ganhar sobrevida sexual. E Neto, o careta da turma, que nunca teve vícios, incapaz de trair a mulher ou as amizades. Os cinco, já na casa dos 70, 80 anos, impõem-se pelas idiossincrasias da relação entre o que representam e o que personalizam.
Escrever um livro em primeira pessoa requer uma aproximação que necessita de habilidade narrativa para não diluir a história que quer se contar. A escritora demonstra essa faceta, agregando à técnica, um gracejo irresistível que torna a leitura agradabilíssima, como o universo “copacabaniano” que evoca. A linha tênue entre humor cotidiano e certa melancolia do tempo equilibra as emoções que o interesse pela leitura corrente vai nos tomando. Assim, você reflete sobre a relação do homem com a finitude da vida, sem fazer disso uma reflexão filosófica sobre o ser. Daí, Fernanda Torres gabarita-se também como uma criadora de recursos múltiplos.
Depois de “Fim”, que venham outros princípios literários. E cênicos. E crônicos.
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