“Polícia Federal - A Lei é para Todos” tenta, mas não consegue, ser totalmente imparcial – Ambrosia

“Polícia Federal – A Lei é para Todos” tenta, mas não consegue, ser totalmente imparcial

Antes de mais nada, um aviso a todos que lerem esse texto: O que está escrito a respeito de “Polícia Federal – A Lei é para Todos” (Brasil, 2017) analisa apenas o filme, sua construção e seus prós e contras como cinema. Não haverá aqui defesas de lado (direita ou esquerda) nem apontamento sobre quem está certo ou errado a respeito da investigação sobre corrupção no Brasil que está ainda em curso. Em outras palavras, essa crítica aqui será apolítica e apartidária.

Feitos os esclarecimentos, vamos lá.

É curioso notar que, em 2017, o cinema brasileiro comercial lançou produções inspiradas em eventos ocorridos na nossa História recente. Primeiro foi “Real: O Plano Por Trás da História”, que conta como foi criado o plano econômico que deu, por um tempo, estabilidade econômica ao Brasil e que, segundo o parceiro Cesar Monteiro, “abusa de clichês na sua linguagem visual com objetivo de dar um tom épico à trama”. E, depois veio “Polícia Federal – A Lei é para Todos”, que procura dramatizar os eventos que levaram à criação da Operação Lava Jato e o trabalho dos oficiais para investigar as denúncias de corrupção que envolveram empresários e políticos.

O filme procura explicar os acontecimentos de forma bem didática e faz o possível para mostrar que não toma partido de nenhum grupo em especial. Mas derrapa um pouco justamente nisso quase no desfecho e, para piorar, alguns diálogos e atuações ficam fora do tom, prejudicando o resultado final.

A trama mostra quando, após uma operação de apreensão de drogas ocorrida em Araraquara (SP), uma equipe da Polícia Federal liderada pelo delegado Ivan Romano (Antonio Calloni) inicia uma operação para descobrir quem está envolvido em uma enorme rede de corrupção que lavava dinheiro e pagava propinas. O grupo, formado também pelos delegados Beatriz (Flavia Alessandra), Julio Cesar (Bruce Gomlevsky) e Vinícius (João Baldasserini), participa de uma força tarefa para prender os suspeitos, entre eles o doleiro Alberto Yusseff (Roberto Birindelli) e o ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa (Roney Faccinni), cujos depoimentos levam a mais prisões, sempre autorizadas pelo juiz Sérgio Moro (Marcelo Serrado). As investigações acabam chegando até ao ex-presidente Lula (Ary Fontoura), que também estaria envolvido no esquema.

Inspirado no livro de mesmo nome, escrito por Carlos Graieb e Ana Maria Santos (lançado pela Editora Record), “Polícia Federal” funciona bem quando se concentra em relatar os fatos, ainda que de forma bem tradicional, sem grandes inovações. O filme flerta com a “modernidade” ao inserir animações para mostrar que a corrupção vem desde os tempos do Descobrimento do Brasil (algo meio óbvio para quem não faltou às aulas de História na escola), mas não vai muito além disso.

Se o objetivo dos realizadores era apenas informar ao público o que aconteceu durante a Lava Jato, OK. Mas falta a ele um algo a mais para torná-lo relevante cinematograficamente falando. De qualquer forma, vale destacar positivamente a direção de Marcelo Antunez, que até então só tinha assinado a direção de comédias como “Um Suburbano Sortudo”, e não parecia ser a pessoa ideal para esse projeto. Mesmo não sendo fora do comum, seu trabalho é bastante eficiente, especialmente nas cenas de ação e nas que envolvem manifestações populares.

O roteiro de Gustavo Lipsztein e Thomas Stavros se preocupa tanto em contar sua história de maneira imparcial que esquece de desenvolver seus principais personagens. Pouco é informado sobre eles, tornando-os bem superficiais. Um ou outro é mostrado com suas famílias, com alguma questão mais importante, como o pai que confronta o filho policial por achar que a Lava Jato só investiga pessoas de um único partido político. Pena, no entanto, que esse conflito é resolvido muito rapidamente e deixa escapar uma questão que poderia render bem mais, dramaticamente falando.

Outro problema é que, em sua parte final, Lula tem suas más qualidades mais enfatizadas, dando ares de vilão que chega a ser arrogante. O maniqueísmo, que era evitado até então, aparece com mais ênfase a partir do momento em que ele surge na trama. Isso afeta até mesmo a trilha sonora, que coloca, meio escondido, alguns acordes de “The Imperial March”, o tema do império galático que apareceu pela primeira vez em “O Império Contra-Ataca” para deixar claro que o ex-presidente é o mal encarnado a ser combatido. Isso poderia ser, certamente, evitado. Além disso, algumas falas patrióticas demais soam pouco naturais e quase chegam ao ridículo.

Protagonista do filme, Antonio Calloni se destaca do resto do elenco com uma interpretação precisa e bem carismática como o líder dos delegados da Lava Jato. Quem também chama a atenção é Roberto Birindelli, que faz Yousseff com muita ironia e chega a fazer rir com suas tiradas. Flavia Alessandra e João Baldasserini pouco têm a fazer com seus personagens rasos, mas também não comprometem. Já Bruce Gomlevsky, que se destacou no teatro ao viver o cantor Renato Russo, perde o tom de seu personagem e seus momentos de explosão chegam a ser risíveis.

Ary Fontoura, como Lula, acerta em não querer imitar o sotaque característico do ex-presidente para parecer mais natural, mas não consegue mostrar por que o político é tão querido por tantas pessoas (apesar das acusações pesadas contra ele), mostrando-o mais como um velho rabugento e rancoroso. Marcelo Serrado não faz grandes esforços para tornar seu Sérgio Moro mais interessante e relevante para a história, limitando-se apenas a fazer cara séria e de poucos amigos em boa parte do filme.

“Polícia Federal – A Lei é para Todos” tem nítidas inspirações a recentes filmes-denúncia baseados em fatos que fizeram muito sucesso, como “Spotlight: Segredos Revelados” ou “A Grande Aposta”, sem chegar à excelência deles. Mas não chega a ser totalmente dispensável, especialmente para quem quer entender melhor o que está acontecendo em nosso país. De qualquer forma, mesmo que pareça estranho fazer um filme sobre um acontecimento que ainda não acabou, pelo menos a produção pode encontrar seu público com uma proposta diferente das comédias que tanto lotam as salas de cinema. Algo que o cinema brasileiro precisa tanto e em vários gêneros.

Ah, sim! Há cenas durante os créditos e uma surpresinha ao final deles.

Filme: Polícia Federal – A Lei é Para Todos
Direção: Marcelo Antunez
Elenco: Antonio Calloni, Flavia Alessandra, Ary Fontoura
Gênero: Drama Policial
País: Brasil
Ano de produção: 2017
Distribuidora: Downtown Filmes/Paris Filmes
Duração: 1h 47min
Classificação: 12 anos

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Comentários 2
  1. Eu achei diferente, achei que retratou bem a realidade e para mim foi emocionante do inicio ao flm, um relato histórico do momento atual. Também gostei do outro filme citado, sobre o Plano Real, são filmes que nos tocam profundamente!!! Mas a critica não apenas bate, tambem enaltece, o que achei legal, cada um vê de um jeito cada obra, e essa eu gostei por demais!

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