Grandes filmes épicos já fazem crescer os olhos naturalmente. Ben-Hur, Gladiador, Coração Valente, para citar alguns. Sendo bíblicos então, parece que há um público mais sedento por eles. Independente da veracidade aplicada ou se acreditam ou não na história contada, são sempre um prato cheio para aqueles que curtem o gênero. Afinal, justamente por não poder ser provado na maioria das vezes é o que acaba dando mais asas à imaginação dos diretores e roteiristas. Darren Aronofsky, bastante admirado por possuir um olhar e uma estética peculiar em seus filmes, aborda esta história bíblica, a qual já teve muitas interpretações, de um ponto de vista mais humano e acrescenta novos e interessantes elementos a trama.
Noé (Russell Crowe) é descendente de Lamech (Marton Csokas), que é descendente de Methuselah (Anthony Hopkins), que é sucessor de Set, o terceiro filho de Adão e Eva, que como todos sabem foram expulsos do paraíso ao provar do fruto proibido. Caim matou Abel e todos aqueles pertencentes a sua linhagem tomaram conta da terra e não a respeitam assim como os animais que nela vivem. Já Noé, após a morte do seu pai causada por um filho de Caim, vaga solitário pelas planícies juntamente com sua esposa, Naameh (Jennifer Connelly), e seus três filhos. Uma noite, Noé tem uma visão enviada pelo Criador e precisa procurar seu avô. Ele então parte com sua família, mas não sem antes enfrentar alguns perigos pelo caminho e até salvar uma criança abandonada no local onde ficam os Guardiões, anjos caídos que desceram a Terra para ajudar os homens, contrariando as ordens do Criador e não podem mais retornar aos céus. Ao se encontrar com Methuselah, Noé consegue finalmente entender qual é a sua missão, além de descobrir que não há mais salvação e que para que a Terra seja pura de novo, ela deve terminar em água e começar outra vez. Com o auxílio dos Guardiões e de sua família, ele começa a construir a Arca, mas tal projeto não passará despercebido e ele irá enfrentar muitos obstáculos e provações antes de concluir sua missão.
Ao escolher uma passagem da bíblia (não só a cristã) que é bastante aberta a interpretações, Aronofsky optou por uma abordagem sábia ao não enveredar por um caminho totalmente voltado a uma religião em específico. Por mais que se trate de um filme religioso (e ele é, não se iluda) as terminologias são mais abrangentes e não aquelas comumente usadas pelos católicos e demais religiões. Não há referências a demônios ou o inferno, o ser superior é chamado de Criador o tempo inteiro – e não de Deus – e há elementos interessantes como os anjos caídos. Nada disso teria muito sentido se o personagem de Crowe falhasse o que, ainda bem, não acontece. Seu Noé é mais humano e é justamente isso que faz toda a diferença, pois ao aceitar a tarefa, é ele o responsável por fazer com que todos a sua volta evoluam, assim como ele próprio.
Logo, a interação entre os personagens é um dos pontos altos do filme que contém cenas muito emocionantes. A química entre Crowe e Connelly é imediata, tendo em mente que os atores já haviam contracenado juntos antes, o que obviamente facilita, mas, por algumas vezes ela se apaga um pouco e não entrega mais do que o exigido no momento. Ao contrário de Emma Watson que é pura emoção e chora com imensa facilidade, deixando suas cenas num modo geral bem mais interessantes para o espectador. Os demais atores jovens são comedidos e não possuem tanto destaque. No entanto, veteranos como Anthony Hopkins que, mesmo com um papel singelo, faz um bom trabalho e Ray Winstone que constrói um ótimo contraponto com o personagem de Russell Crowe, mostram a que vieram.
Obviamente que por se tratar de um filme desse porte, muitos dos elementos em cena são efeitos de computação gráfica – como a maioria dos animais, os guardiões e até a própria arca. Mas, nada disso diminui o impacto que o mesmo tem sobre o espectador, pois ao escolher cenários reais e minimalistas, como as belíssimas paisagens da Islândia é que o diretor consegue dimensionar o peso da trama e sua relevância histórica. Darren Aronofsky nos convida não somente a assistir ao filme, mas a nos indagar, mesmo que superficialmente, o nosso papel nesse planeta e não exatamente de um ponto de vista religioso, mas sim filosófico.
E pensar que tiraram ele da direção do novo Wolverine