Crítica: "Homens, Mulheres e Filhos" faz pensar sobre as relações num mundo com internet

Crítica: "Homens, Mulheres e Filhos" faz pensar sobre as relações num mundo com internet – Ambrosia

Antes de começar a ler sobre o novo filme de Jason Reitman (de sucessos como “Juno” e “Amor Sem Escalas”), responda mentalmente às seguintes perguntas: “Quantas vezes você já olhou seu Facebook, Twitter, Google+ ou outra rede social hoje?”, “Quantas fotos ou comentários você já curtiu ou comentou?” e “Com quantas pessoas você conversou através de seu computador/notebook/tablet/smartphone?”. Respondeu? Agora responda isso: “Quantas palavras você trocou com qualquer pessoa olhando no olho dela hoje? Lembra o que conversavam?”. Pois é, provavelmente foram poucas e superficiais, já que, nos dias de hoje, a maioria de nós se preocupa muito mais (e se revela muito mais) no mundo virtual do que no mundo real, sem perceber que tudo o que consideramos importante no nosso universo, na verdade é pequeno e irrelevante. Por esse e outros motivos, “Homens, Mulheres e Filhos” (“Men, Women and Children”) levanta um interessante questionamento sobre como estão as relações interpessoais em grande parte do nosso planeta.

A trama, inspirada no livro de Chad Kultgen, se passa numa típica cidade americana e seus habitantes de classe média. Assim, temos Don Truby (Adam Sandler), um homem que está casado há anos com Helen (Rosemarie DeWitt) e vive aquele momento de acomodação que acontece com muitos casais. Em busca de mais emoção, ele recorre a vídeos pornográficos na internet e pensa em contratar os serviços de uma acompanhante profissional. O que ele não sabe é que a esposa está pensando na mesma coisa.
Há também Tim Mooney (Ansel Elgort), o principal jogador de futebol da escola, que decidiu largar os esportes depois que a mãe deixou o pai para ficar com outra pessoa e passa a ficar horas jogando on line. Além das partidas no computador, o rapaz decide se aproximar de Brandy Beltmeyer (Kaitlyn Dever), cuja mãe Patricia (Jennifer Garner) vigia todos os seus passos e exige saber todas as suas senhas usadas em emails ou redes sociais para impedir que ela seja vítima de algum pervertido.
Outro caso é o de Donna Clint (Judy Greer), uma atriz fracassada que quer tornar a filha Hannah (Olivia Crocicchia) famosa a qualquer preço, mesmo que tenha que expor a garota (e ganhar dinheiro) com fotos sensuais no seu site pessoal. Isso sem falar em Allison Doss (Elena Kampouris) que resolve seguir conselhos pouco ortodoxos em algumas páginas na rede para perder o peso por se achar gorda. Todos conectados com os seus aparelhos, porém desligados de todo o resto.

Com bastante ironia, algo que é comum na maioria de seus filmes realizados até agora, Jason Reitman mostra que, cada vez mais, as pessoas estão bem mais preocupadas em se isolar em seus mundos particulares do que se aproximar cada vez mais uns dos outros. Culpar a internet por isso é um erro, já que isso é uma justificativa simplória demais e o diretor parece saber disso, ao retratar as decisões às vezes equivocadas dos seus personagens diante de seus computadores, como a vigilância excessiva de Patricia (numa interpretação surpreendentemente muito boa de Jennifer Garner) ou mesmo numa cena em que Tim desabafa com seus amigos de jogo sobre a situação de sua mãe e ouve conselhos pornográficos.
Outro elemento interessante e bastante atual que o filme discute é a vontade que muitos têm de se tornar celebridades instantâneas, mesmo não tendo muito (ou nenhum talento), como ocorre no caso de Hannah, sem perceber as consequências. Essas e outras questões são mostradas de forma instigante e até simpática pelo roteiro escrito por Reitman e Eris Cressida Wilson, mesmo que alguns possam se incomodar com a comparação que a produção faz da vida dos personagens com o texto “Pálido Ponto Azul”, de Carl Sagan, narrado por Emma Thompson, que mostra como a Terra foi vista através da fotografia tirada do espaço pela nave Voyager.

No elenco, além de Garner, Adam Sandler também surpreende positivamente com sua composição para Don Truby. Ele encontra o tom ideal para viver o marido que, apesar de querer retomar a chama de sua vida, se vê preso a um casamento que não consegue sair do tédio. Se ele se dedicasse mais aos dramas do que as comédias, seria um ator bem melhor.
Ansel Elgort, mais conhecido do grande público após viver o protagonista de “A Culpa é das Estrelas”, consegue deixar de lado a sua porção de galã e convence como um jovem que perdeu o chão após a separação dos pais e procura um novo rumo para a sua vida, além de fazer um bom par com Kaitlyn Dever, com uma dinâmica interessante ao mostrar que os adolescentes, mesmo envolvidos romanticamente, não costumam conversar muito entre si nem mostrar de primeira as suas vulnerabilidades. Judy Greer mostra a sua habitual competência como a mãe que não percebe, inicialmente, o preço de fazer tudo para que a filha se torne conhecida. J.K. Simmons, habitual parceiro de Reitman, aparece pouco como o pai de Allison. Mas sua presença em cena não deixa de ser percebida.

A principal qualidade de “Homens, Mulheres e Filhos” é que, mesmo com alguns momentos divertidos, o filme faz pensar sobre como, cada vez mais, não conhecemos bem quem está ao nosso redor. Muita gente extrapola quando usa a internet e o filme possui elementos e situações que muitos de nós já testemunhou pessoalmente, criando uma verdadeira identificação sobre algo vivido no que chamamos de “realidade”. Algo para sempre refletirmos quando surge o mais novo computador, smartphone ou rede social no mercado.

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Comentários 2
  1. Pela sua crítica o filme parece ser muito interessante. Mesmo assim ele foi eleito o terceiro pior filme de 2014 pela revista Time. Você viu a lista dos dez melhores e dez piores filmes do ano pela Time? Abraços!

    1. Li sim e não entendi por que. A maioria dos críticos está elogiando bastante o filme e no Festival do Rio, onde foi exibido antes de entrar em circuito, foi um dos favoritos do público. Às vezes, acontece de um filme ser completamente destruído em seu país natal e fazer muito sucesso tanto de crítica quanto de público em outros. Acho que é o caso deste filme. Então, dar uma chance a ele não vai fazer mal. Abraços.

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