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Deadpool & Wolverine expõe o buraco em que a Marvel se meteu

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Esse texto contém spoilers

Quando foi anunciada a compra da Fox pela Disney, a pergunta mais frequente era: “e como fica o Deadpool?”. O mercenário bocudo da Marvel teria a mesma “liberdade de expressão” que possuía até então? “Deadpool & Wolverine”, terceiro filme do personagem para o cinema, e o primeiro sob a batuta da Casa do Mickey, chega para mostrar que a promessa do chefão Kevin Feige de manter bem desbocado o anti-herói – que é uma paródia do Exterminador da rival DC – foi cumprida. E no melhor estilo Wade Wilson, com muita influência do ator Ryan Reynolds, que abraçou a franquia para si, salvando o personagem do destino errático a que parecia destinado (“X-Men Origens: Wolverine” alguém?), o esquematismo do cinema de super-herói é colocado em xeque.

“Deadpool & Wolverine” abusa do recurso metalinguístico até mais do que da quebra da quarta parede (que se dá de forma mais sutil do que nos dois longas anteriores) para expor o buraco em que a Marvel, e o gênero super-heróis como um todo, acabou se atolando. Universos são criados e expandidos de forma que se perde de vista, como no caso do MCU, ou reiniciados pelo meio do caminho como a DC. E o que acontece com aqueles personagens que ficaram para trás? O destino é o Vazio.

Isso mesmo, o cenário conhecido pela série “Loki” funciona como um depósito para os personagens que tiveram seus universos destruídos. Daí é a plataforma para desfilarem vários personagens da Fox, sobretudo os vistos nos filmes dos anos 2000. “Sou fã, quero service”, diria o (hoje ex) apresentador daquele famoso videocast daquele famoso site que pavimentou a cultura nerd no Brasil. Podemos dizer que ele foi elegantemente escarniado (para regozijo de seus detratores). Se o Vazio é um lixão e é dali que parte o fan service do filme, o recado é claro: esse ato de mimar os nerds com aparições, referências, etc., é o dejeto maquiado de pepita que dá uma aparência mais bela a tramas apoiadas na mesmice.

Não que “Deadpool & Wolverine” seja um primor de argumento. Mas essa crítica aos mecanismos que forjaram a receita dos filmes de super-herói é pertinente, sobretudo neste momento em que o gênero se encontra e crise. E nesse 2024 com apenas duas produções (a em questão da Marvel e “”Coringa 2” da DC), tal reflexão é bem-vinda. Aquele cenário que lembra o de Mad Max, onde boa parte do filme se passa, pode perfeitamente ser encarado como uma metáfora do estado em que o gênero se encontra.

Claro que nem tudo é mensagem subliminar. A produção tem seus momentos de massagear os fãs como na sequência em que Deadpool, ao som da música ‘The Power of Love’, clássico tema de “De Volta Para o Futuro”, do Huey Lewis and the News, vai em busca de um Wolverine de outras realidades para ocupar o lugar do falecido Logan em sua Terra 10005. É a deixa para Hugh Jackman encarnar diversas versões do carcaju nas HQs, sendo que em uma, logo a primeira que aparece, é sua versão diminuída por CGI, deixando-o da maneira que muitos fãs mais aguerridos gostariam de ver o personagem: baixinho e peludo, exatamente como foi concebido. E essa busca leva mercenário a uma realidade em que Wolverine é Henry Cavill, uma ótima brincadeira com a especulação de que o ex-Superman assumiria o papel do mutante canadense dentro do MCU.

Essa pândega é competentemente orquestrada pelo diretor Shawn Levy em mais uma empreitada com o chapa Ryan Reynolds (tocaram juntos “Free Guy: Assumindo o Controle” e “Projeto Adam”). A diversão é a palavra de ordem. Fica nítido que os atores se divertiram no set, com todos entrando no espírito, como Chris Evans reprisando o papel de Tocha Humana do Quarteto Fantástico, Wesley Snipes retornando a Blade, Jennifer Garner trazendo de volta sua Elektra e até Channing Tatum colocando para jogo o seu Gambit sempre prometido e nunca realizado.

As motivações da vilã Cassandra Nova (Emma Corrin correta) – irmã de Charles Xavier – são rasteiras? Sim, é a velha obsessão pela destruição do universo. Nada novo no MCU. Mas se encaixa bem dentro da proposta que nunca foi escondido ser juntar os dois produtos do projeto Arma X e, claro, colocá-los para se engalfinhar. Os dois principais confrontos são impagáveis: um em frente ao logo da 20th Century Fox destruído, remetendo à Estátua da Liberdade no final de “O Planeta dos Macacos”, e o outro dentro de um Honda ao som de ‘You’re the One That I Want’, do musical “Grease”.

“Deadpool & Wolverine” se vale da realização do sonho de Reynolds em trabalhar com Jackman e química dos dois é evidente. Deadpool ainda é o protagonista, mas Wolverine é mostrado de todas as formas que os fãs sempre quiseram ver, inclusive usando seu icônico uniforme e nos presenteando ao vê-lo usando sua máscara, após quase 25 anos de espera. Quem esperava a entrada definitiva dos X-Men e do Quarteto Fantástico no MCU vai se decepcionar (e a cena pós-créditos é apenas uma piada). Mas para quem há um bom tempo questiona o mecanismo dos filmes de super-herói, vale a pena conferir essa sátira revisionista

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