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Festival do Rio 2025 – O Agente Secreto expõe as varizes da ditadura brasileira

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Logo em sua abertura, “O Agente Secreto” mostra em seu letreiro que “a história se passa em 1977, uma época cheia de ‘pirraça'”. Como se sabe, não é o primeiro longa a abordar os anos de chumbo. O recente “Ainda Estou Aqui”, lançado há um ano e também aposta do Brasil no Oscar, que se sagrou vencedor da categoria de filme estrangeiro também tinha o período como cenário. No entanto, enquanto Walter Salles conta a história de uma mãe de família cujo marido some na ditadura, deixando claro quem é o inimigo, o que Kleber Mendonça Filho, que assina roteiro e direção, faz é transpor a tensão causada pelo regime que é retratado da maneira como ele realmente se dava: velada.

O filme acompanha Marcelo (Wagner Moura), um professor de tecnologia de 43 anos que abandona a agitação de São Paulo e decide recomeçar a vida em Recife. Contudo, o que parecia ser uma fuga tranquila do passado, no entanto, logo se revela um retorno inevitável aos fantasmas que o perseguem.

Recife o recebe em plena semana de Carnaval — um tempo de euforia, barulho e excessos que contrasta com seu desejo de silêncio e isolamento. Mas à medida que a cidade desperta em ritmo de festa, o protagonista percebe que o caos que queria deixar para trás o seguiu até ali. O clima abafado e as ruas coloridas escondem olhares desconfiados e uma tensão crescente. Marcelo sente-se observado, espionado, e o suposto refúgio se transforma em um novo labirinto de desconfiança.

Kleber procura trabalhar a ameaça que ronda expondo apenas o que se via no dia a dia do cidadão comum, alheio à ideia de uma ditadura em curso no país. Não que o personagem de Wagner Moura não soubesse, assim como o grupo de “refugiados” do qual fazem parte a dentista Cláudia (Hermila Guedes), Haroldo (João Vitor Silva), um casal de angolanos, todos muito bem protegidos por Dona Sebastiana, uma insuspeita senhorinha que os abriga, auxilia e desvia devidamente qualquer atenção indesejada – vale observar como a resiliência é um tema recorrente da obra do cineasta. Todavia, o que é colocado na tela como uma aparente história policial, é perfeitamente compreendido por quem tem ciência do período. Ali estão as varizes da gestão dos militares que não só perseguiam e torturavam, como davam espaço a esquemas de corrupção pública, e uma ampla rede de assassinos profissionais para executar o serviço sujo que uma classe abastada, que teve papel fundamental para a chegada dos milicos no poder, jamais faria. E esse trabalho muitas vezes era terceirizado, o que mostra toda a complexidade daquele contexto cheio de camadas, que cineasta procura abordar.

Assim como na época do regime o recado de certas obras cinematográficas, teatrais ou musicais era escamoteado para escapar da censura, Kleber cria seu longa como se quisesse fugir da repressão, como se fosse mesmo uma produção dos anos 1970. A saída é transformar essa ficção com tonalidades de documentário (fazendo o caminho inverso de Retratos Fantasmas, documentário que possui revestimento de uma ficção), com algumas quebras berrantes de fantasia, como tubarões devoradores ou uma perna decepada que aterroriza a cidade, desviando a atenção dos verdadeiros perigos à solta pelas esquinas.

E de fato o filme se reveste da linguagem imagética daquele período, desde os créditos iniciais, que seguem exatamente o modelo das produções daquela década, a fotografia, que apresenta uma textura que realmente aparenta ter sido feito em película, levando o espectador a uma autêntica viagem no tempo. A reconstituição de época com ajuda de CGI é tão eficaz quanto a proporcionada por Walter Salles em “Ainda Estou Aqui”.

Wagner Moura, interpreta o protagonista transmitindo a angústia e a tensão do perigo à espreita que não tarda para ganhar a cumplicidade do espectador. É uma atuação densa, minimalista, e é nisso que reside sua pujança. Ele é amparado por um elenco irretocável (inclusive formado em boa parte por pernambucanos e nordestinos, com destaque para a reluzente participação de Maria Fernanda Cândido e para Tânia Maria, que rouba todas as cenas como Dona Sebastiana.

“O Agente Secreto” pode até ser visto como uma continuação espiritual de “Retratos Fantasmas”, já que temos o cinema São Luiz do centro da capital pernambucana com um protagonismo, inclusive suas entranhas, como a cabine de projeção e um quarto para os técnicos do Rio de Janeiro se hospedarem. É como se fosse um narrador personagem e fazendo o tempo todo o paralelismo dos filmes de terror que exibe (como “Tubarão” e “A Profecia”)com a realidade do lado de fora naquela época, quase que como uma súplica de socorro. Mas quem disse que o filme fala sobre os tempos da ditadura?

O Agente Secreto

O Agente Secreto
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Nota: 9/10 - Fantástico
Nota: 9/10 - Fantástico
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