"Godzilla" vem imbuído da glória e da tradição dos filmes de monstro

Os filmes de monstro parecem mesmo ter voltado aos holofotes da indústria cinematográfica nos últimos anos. Duas produções recentes se destacam em meio a esse redescobrimento do gênero (que geralmente é associado ao trash): “Cloverfield- O Monstro”, produzido por J.J. Abrams (e lançado em 2008) e “Círculo de Fogo”, de Guillermo Del Toro, lançado em 2013. O novo exemplar de peso a se juntar no hall é “Godzilla” (Godzilla, E.U.A/2014), dirigido por Gareth Edwards e que chega aos cinemas nesta quinta-feira. Trata-se da segunda adaptação hollywoodiana do kaiju mais querido da cultura pop japonesa, criado pela Toho Company em 1954. Dessa vez o estúdio que assume a empreitada é a Warner/Legendary Pictures, que entra no lugar da antiga detentora dos direitos, a Tristar Pictures. Criado por Tomoyuki Tanaka, Ishiro Honda e Eli Tsuburaya, Gojira (como é chamado no original) ganhou 28 aparições em longas produzido pela Toho. O monstrengo já encarou de tudo: desde uma versão animada da Hanna-Barbera, até um confronto com King Kong – em uma produção para lá de B -, em  “King Kong VS Godzilla”, lançada em 1962. Para se ter ideia da podreira, nessa co-produção da RKO com a Toho os africanos da ilha de King Kong são japoneses pintados de preto(!!!).
A versão 2014 chega com toda pompa de definitiva (até o próximo reboot, lógico). Na trama, abalos sísmicos intensos são sentidos na Ásia, a princípio atribuídos à característica natural da região. Porém, cientistas e pesquisadores buscam saber a verdadeira razão de tamanho impacto, sobretudo Joe Brody (Bryan Cranston, de “Breaking Bad”) e a equipe liderada pelo Dr. Serizawa (Ken Watanabe). Quinze anos após um grave acidente em uma usina nuclear japonesa, vem finalmente à tona o que de fato ocasionou aquela catástrofe. E, da forma mais violenta possível, chega ao território americano trazendo devastação, mobilizando uma operação militar quase suicida, da qual fará parte Ford (Aaron Taylor-Johnson, de “Kick Ass”), filho de Joe, que luta também para se reencontrar com a família em meio ao caos.
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O visual do monstro é algo que, com certeza agradará aos fãs por ser muito fiel ao original japonês só que em tamanho maior (Godzilla está assustadoramente gigante neste filme). Com 100 metros de altura, é a maior escala do bicho já feita (dê preferência a salas IMAX, Maxscreen ou Evolution, a maior que tiver em sua cidade para sentir o impacto). Esqueça aquela iguana anabolizada do patético filme da dupla de “Independence Day” (o diretor Roland Emmerich e o produtor Dean Devlin). A versão 2014 se move com peso titânico, e não com a leveza e agilidade de um velociraptor. E ainda lança seu famoso raio pela boca, o que vai estampar sorrisos em muitas faces com mais de 40 anos. Ao contrário da produção de 1998, que se tratava de uma apropriação indébita do personagem, esta aqui apenas pega emprestado, mas sem deixar sua origem em segundo plano – tanto que quase metade do filme se passa na Ásia. E quando chega aos Estados Unidos, o alvo é a costa oeste (uma vez que vem do Pacífico). Muito mais plausível do que invadir Nova York.
Edwards soube manter toda aquela atmosfera das versões japonesas. A diferença é que em 1954, quando foi criado, Godzilla refletia a paranoia dos japoneses em relação à segunda guerra e, sobretudo, às bombas atômicas que devastaram Hiroshima e Nagasaki. Neste filme, a destruição causada pelos monstros (sim, monstros, Godzilla não está só!) personifica o trauma do 11 de Setembro, com a tragédia transmitida nas “breaking news” incessantes na TV, e mostrando uma investida ineficaz das forças armadas objetivando reagir à destruição com mais destruição (como as tropas no Afeganistão e Iraque).
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Vale ressaltar que, para que filmes como esses passem uma tensão verossímil para o espectador, faz-se necessário um bom aproveitamento do elemento humano. Se as pessoas forem apenas bonecos correndo de um lado para o outro, dizendo frases clichês, o público não se identifica (logo não se importa). Por isso, Edwards e os roteiristas, Max Borenstein e Dave Callaham (que assinou o script de “Os Mercenários”), tiveram todo o cuidado em desenvolver personagens críveis, que ganham ainda mais devido a atuações como a de Cranston e de Watanabe. O fio condutor é um drama familiar, deixando claro a opção de dar relevância à história dos personagens, ao invés de cair na armadilha de deixá-los como mera escada para o monstrengo brilhar. Ele brilha, e muito, mas no momento dele. E demora um pouco para aparecer.
Edwards usa um pouco da tática de Spielberg em “Tubarão”: prepara o terreno, criando um suspense para depois sim, entregar o “vilão” em sua totalidade. Passamos boa parte da projeção vendo apenas o dorso do monstro, antes de ele surgir com toda sua magnitude. Em seu filme anterior, “Monstros”, de 2010, o diretor também se utilizou dessa técnica de suspense. Também chama a atenção a fotografia de Seamus McGarvey, que também fez belos trabalhos em “Sahara”,” Os Vingadores” e “Anna Karenina”. McGarvey soube emular o clima das produções da Toho nas cenas de destruição e luta de monstros, mas com o apuro técnico de uma superprodução hollywoodiana atual. Porém, boa parte das cenas é noturna ou escura, o que pode ser problema em algumas salas de cinema. Claro, o filme foi produzido contando com sua exibição em salas americanas e europeias, por exemplo, onde a qualidade de projeção é impecável. Infelizmente por aqui é bastante comum projetores com luminosidade diminuída propositalmente por economia e foco mal regulado, o que pode prejudicar seriamente a experiência.
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O 3D é muito bom nas cenas em que se faz necessário, dando o efeito de profundidade que gera imersão. Já nas cenas em que poderia ser dispensado, temos aquele incômodo “efeito recorte”. No todo, é recomendado assistir em 3D, mas quem for assistir à cópia 2D não perderá nada extraordinário.
Por fim, tenho duas notícias: uma boa e uma ruim. Começo pela ruim: o filme não chega a ser tão bom quanto “Círculo de Fogo”, sem dúvida a melhor incursão hollywoodiana no gênero kaiju. A boa é que este Godzilla está muitos níveis acima da bisonha e oportunista produção de 16 anos atrás. O filme até tem alguns pequenos defeitos, mas é eficiente em evocar a glória dos filmes de monstro. Os fãs do gênero agradecem.

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