Adaptar Lobisomem para o cinema, em tese não é uma tarefa das mais difíceis. Basta criar uma história seguindo os ditames do clássico da Universal, caso queira, adicione alguns elementos modernos e o sucesso é garantido. O mesmo se pensa em relação aos outros monstros clássicos eternizados no cinema pelo estúdio, como Drácula, Frankenstein, Homem Invisível e a Múmia. Ocorre que a coisa n]ao é tão simples assim, e o cineasta Leigh Whannell resolveu inovar ao criar seu “Lobisomem”, justamente para fugir do que já foi mostrado à exaustão em diversas produções.
Nessa nova criação da produtora Blumhouse, um homem trava uma luta angustiante para proteger sua família de uma misteriosa criatura da floresta. Mas conforme a noite avança, o homem começa a se comportar de forma estranha, e a luta passa a ser também para manter sua filha e esposa a salvo da ameaça que ele próprio possa vir a apresentar.

Whannell, conhecido por seu trabalho como roteirista na franquia Jogos Mortais, conquistou elogios por sua nova versão de “O Homem Invisível”, de 2020, também pela Blumhouse. A releitura acendeu nos fãs de lobisomem uma grande expectativa sobre o que ele traria nessa abordagem da lenda.
De fato o cineasta procurou se distanciar do que fora visto previamente e optou por algumas liberdades criativas que podem incomodar alguns puristas. Por outro lado, podem perfeitamente ser bem recebidas por aqueles que estão abertos a um novo conceito. Há ali alguns elementos que remetem a Jogos Mortais, de fato. Até mais do que em sua última adaptação de um monstro clássico. Mas é possível notar influências evidentes de “O Iluminado” e “A Mosca”. Isso mesmo, esse lobisomem se constitui de um body horror aflitivo, uma transformação lenta, gradual e carregada no gore.
No entanto, ainda que as novas ideias sejam bem-vindas, o resultado não demonstra um novo divisor de águas como foram, por exemplo, “Grito de Horror” e “Um Lobisomem Americano em Londres”, ambos de 1981. E também não é tão instigante e envolvente como “O Homem Invisível”. Há sequências que até conseguem provocar uma certa tensão no espectador, mesmo que a solução seja facilitada por conveniências de roteiro, mas nenhuma exatamente impactante. O trunfo está mesmo na transformação física do personagem e na ambientação hostil (que até poderia ter sido explorada de forma melhor), que é determinante para criar a atmosfera correta de um conto de terror.

Christopher Abbott em uma atuação baseada em fisicalidade, ainda que com o suporte dos efeitos especiais, faz um trabalho crível. A conexão de Blake com sua filha (Matilda Firth) é o que move a história e faz com que o drama ganhe mais peso quando chega o momento mais crítico. Ele vive um casamento com Charlotte, que, apesar de se mostrar ligeiramente fragilizado, há um esforço comum para que se mantenha. Julia Garner faz um papel que acaba, de certa forma, apresentando uma certa semelhança com o de Elisabeth Moss refém do invisível companheiro abusivo. A configuração aqui é diferente, pois o que vemos é a transformação do marido e pai amoroso em uma criatura monstruosa. Mas a ameaça continua centrada no âmbito doméstico.
“Lobisomem” é, por fim, uma válida tentativa de conferir ao personagem uma renovação e sobrevida no audiovisual. Ainda que Whannell não o tenha feito com a mesma excelência de “O Homem Invisível”, propõe um entretenimento seguro aos fãs de terror, com aquela ambição marotamente disfarçada de despretensão.
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