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Wild Indian, uma narrativa controversa envolvendo um personagem nativo americano

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Wild Indian (2021) é o primeiro filme de Lyle Mitchell Corbine Jr., jovem diretor que cresceu em reservas indígenas nos EUA, apresentado no último festival de Sundance. Narra a difícil história de um descendente de povos nativos americanos em dois momentos-chave de sua vida.

Um conto de violência passada de pais para filhos, que apresenta dois jovens que compartilham um segredo terrível, que os marca de uma maneira que o futuro lhe reservará surpresas.

A estreia de Corbine Jr. como escritor e diretor é um drama que traz a culpa como mote de sua narrativa. É aí que reside, inversamente, seus pontos fortes  e certas fraquezas, deixando o resultado final não tão bom quanto poderia. Começa com um prólogo, onde vemos um homem Ojibwe, acometido de varíola, cuidando de sua esposa doente; introduzindo sutilmente a noção de sofrimento causado por forças externas.

Fora do controle, o corpo – ou mesmo um povo nativo – tenta em vão combater o vírus de uma força invasora.

O ponto não é trabalhado nem explorado completamente, então avançamos no tempo até a década de 1980, onde Makwa (Phoenix Wilson) esconde as contusões sofridas nas mãos de seu pai de seu professor da escola. Com apenas seu primo Ted-O (Julian Gopal) como companhia, ele deseja escapar da reserva e daquela vida que não suportar.

A violência gera violência e um ato chocante que Makwa comete é ocultado por um pacto de silêncio entre a dupla. Mais uma vez, avançamos no tempo, aqueles meninos agora são homens.  Makwa (Michael Greyeyes) mora na Califórnia, tem uma carreira de sucesso, uma linda esposa e um filho com quem não consegue se relacionar nem parece amar. Ted-O (Chaske Spencer) é reintroduzido no filme, deixando a prisão com tatuagens marcantes – OJIBWE em torno de sua garganta e uma garra de urso em uma bochecha.

A ideia de que este voltou às suas raízes como fonte de consolo em tempos difíceis é contrabalançada pelo uso de sua ascendência indígena como nicho para progredir em uma carreira profissional. Tendo mudado seu nome para Michael Peterson, Magwa parece usar sua herança quando conveniente. Ou talvez sua nova identidade fosse apenas uma maneira de escapar da detecção de seus crimes passados.

Em uma estranha discussão com um colega (Jesse Eisenberg, em participação especial), Michael debate se deve cortar seu rabo de cavalo – uma parte significativa de sua identidade, mas algo que está disposto a cortar e mudar se for vantajoso.

A perfomance de Greyeyes é arrepiante, uma entrega que comunga com a interpretação de Spencer que enfrenta os seus demônios de frente, enquanto tenta esquecer, mudando de nome e de lugar. De diferentes maneiras, os personagens carregam culpa e um passado que os assombra. Em Teddo tudo é mais visível, enquanto no caso de Michael sua origem está escondida atrás do véu de uma vida supostamente modelo.

A estreia de Corbine Jr. é pretende contar um drama, com elementos de um thriller policial para um crime que se esconde no passado dos protagonistas, que ao mesmo tempo pode reverberar naquela pequena fábula inicial que falava dos habitantes originais do que hoje são os Estados Unidos.

Traça assim um caminho de dor e violência, como se a condição fosse transferida através de gerações para moldar, neste caso, os protagonistas. Em particular o primeiro, que antes se chamava Makwa, sofre uma transformação total. De adolescente problemático, torna-se uma espécie de sociopata que conseguiu se assimilar à sociedade em que vive. Nessa jornada, que no filme acontece de forma totalmente elíptica, o personagem perdeu muito ou quase toda a sua humanidade.

Podemos ver que as três pares do filme (o prólogo, a história da adolescência e a história da idade adulta) não se encaixam de forma totalmente harmoniosa, mas ao mesmo tempo têm um significado. Talvez um exemplo; seja um diálogo no meio do filme em que Michael expressa que está cansado de ser filho de perdedores, aludindo aos povos indígenas. Uma frase essencial que ordena as diferentes tramas narrativas, mas por outro lado seria desnecessária em um filme mais fluido.

É mais um estudo de personagem do que uma história previsível de justiça criminal. Embora o filme seja imperfeito, é bem interessante pela visão realista de mundo que apresenta. Recomendamos.

Nota: Ótimo – 3.5 de 5 estrelas

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Cadorno Teles -

Cearense de Amontada, um apaixonado pelo conhecimento, licenciado em Ciências Biológicas e em Física, Historiador de formação, idealizador da Biblioteca Canto do Piririguá. Membro do NALAP e do Conselho Editorial da Kawo Kabiyesile, mestre de RPG em vários sistemas, ler e assiste de tudo.

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