Depois de um hiato de cinco anos, Érika Martins está de volta com um trabalho de inéditas. A cantora é ex-vocalista da banda Penélope, que era figurinha fácil na cena rock nacional ali na virada dos anos 90 para os 2000. Um pouquinho antes da banda estourar ela já tinha ficado conhecida pela participação na música “A Mais Pedida” dos Raimundos. Após o fim da Penélope, Érika formou os Telecats e, em seguida, enveredou por uma carreira solo, que rendeu um disco em 2009, além do seu projeto paralelo – a banda de covers da jovem guarda Lafayette e os Tremendões -, junto com seu marido Gabriel Thomaz do Autoramas (outra banda importante da cena roqueira da virada do milênio), Renato Martins, ex Acabou La Tequila e atual Canastra, e participação de luxo de Lafayette, músico de apoio de vários artistas da época da jovem guarda. Ele foi, inclusive, o criador daquele som de órgão característico das músicas daquele período.
“Modinhas” (Coqueiro Verde) é de fato inspirado no gênero musical que dá o título, tipicamente brasileiro datado do Brasil colonial e com forte apelo sentimental. Lá pelo século XVII tornou-se popular na Bahia e fez sucesso na corte portuguesa. Nas treze faixas do álbum, entre versões e composições próprias, Érika homenageia esse estilo de composição, mas com uma roupagem pop rock/power pop resultando em um dos trabalhos mais inventivos da música brasileira dos últimos anos.
A primeira faixa, “Fundidos“, que foi disponibilizada gratuitamente para download pela cantora antes mesmo do lançamento do disco, é um rock doce e visceral que pode até remeter à Penélope. Na segunda, a belíssima “Dar-te-ei“, Érika contou com Marcelo Jeneci na composição. Merece destaque a versão de “Casinha Pequenina“, que ganhou um conceito roqueiro e belos arranjos que caíram como uma luva. Bastante popular no cancionário popular, a música tem autor desconhecido, mas que, se estivesse vivo, certamente aprovaria a nova versão. Outro momento inspirado do disco é a composição de Tom Zé e Elifas Andreato, “A Curi“, um encontro do pop com o baião e contornos psicodélicos, com um ótimo arranjo de acordeom de Humberto Barros e um refrão baseado em jogo de palavras – “Por que o que salva/ A humanidade/ É que não há quem cure/ A curiosidade/A curi, a curi/ A curiosidade/ Inventou, inventou/ A humanidade/ E o burá o burá/ Buraco da fechadura/ É o burá burá/ Buraco da curió… sidade”. Em sua antiga banda, Érika já havia feito covers de Tom Zé (“Namorinho de Portão” e “Bailarina“). A faixa mais ousada é a transformação de “Modinha (Seresta-Peça nº 5)“, de Villa Lobos, em um vigoroso pop de batida dançante e efeitos, com o pernambucano Otto dividindo os vocais. “A Rosa“, de Sérgio Bittencourt, também ganhou uma versão moderna, com direito à distorções e microfonia, mas se mantendo fiel à essência original.
O disco foi gravado no lendário estúdio Toca do Bandido, do falecido produtor Tom Capone, hoje sob o comando de sua viúva Constança Scofield. Ex-parceira de Érika na banda Penélope, Constança cuidou da direção artística do álbum e ainda participou nos teclados de cinco faixas e na flauta em uma. Além dela, outro parceiro de Penélope, Luisão Pereira, integra a trupe como coautor da faixa “Garota interrompida“. A produção ficou a cargo de Felipe Rodarte, que também participou na guitarra, violão, percussão e piano Rhodes. Rodarte ainda contribuiu compondo, junto com o francês Rami Mustakim do Mademoiselle, a faixa cantada em francês com aquele sabor delicioso característico do pop da terra de Napoleão desde os anos 60. Outras participações são Gabriel Thomaz na guitarra e baixo e o ex-Raimundo Fred Castro na bateria.
“Modinhas” é audição obrigatória. Singelo, poderoso, belo, agressivo, com ótimas melodias, o álbum traz Érika em sua melhor forma, evidenciando que a estrada lhe deu uma bagagem que resultou em seu aperfeiçoamento como artesã pop. A riqueza dos arranjos e a ótima masterização tornam obrigatória a audição em CD, sem a compressão do mp3 e o baixo impacto dos fones de ouvido. É o tipo do som que merece tomar conta do ambiente
maravilhosa!!