Morrissey adota postura paz e amor em show no Rio

No ano em que completa 30 anos de carreira solo, Morrissey retorna à América Latina com a turnê do seu último álbum, “Low in High School”, de 2017. E começou a temporada brasileira com o pé direito no Rio de Janeiro, na noite de sexta-feira (30/11), para uma Fundição Progresso cheia de amor para entregar ao ídolo.

O ex-The Smiths tem dado declarações polêmicas revelando uma orientação política incongruente com sua condição de artista e gay (recém abertamente assumido, depois de anos tido como assexuado). Não que tenha deixado sua contundência em casa.
Quem chegou à casa localizada na Lapa carioca e quis comprar um lanchinho ou aquela cerveja pré-show se deparou com severas regras impostas pela produção do artista (ferrenho defensor dos animais e do ecologicamente correto) que permitiam apenas produtos veganos e baniram os copos descartáveis. Bebidas deveriam ser consumidas em um copo especial “alugado” por cinco reais. Quem não quisesse levar para casa, recebia o dinheiro de volta. É assim em shows do artista na Europa e nos EUA, mas aqui foi uma novidade que pegou muita gente de surpresa.

Já no palco foi só amor, no melhor estilo “sou todo seu”, sem deixar de destilar uma leve ironia aqui e ali. A presença magnética de Morrissey se fez pontualmente às 22h05, hora que estava marcado o início da apresentação.

Os que apostaram no atraso de meia hora perderam um terço do show, que teve duração de uma hora e trinta e dois minutos.

Depois do já tradicional “MorrisseyTube” (playlist para lá de eclética com videoclipes antigos e excertos de filmes que antecede todas as apresentações) o inglês adentra o palco com um clássico do The Smiths ‘William It Was Really Nothing’. Apesar de não ter sido um hit radiofônico no Brasil, o single de 1984 que abre o álbum “Hatful of Hollow” teve recepção calorosa da plateia, sobretudo da pista premium, tomada por fãs ardorosos. E foi para quem acompanha a carreira de Mozza até hoje, e não ficou preso ao passado, que se montou o setlist.

Da sua antiga banda, apenas mais duas músicas além de “William”, ‘Is It Really So Strange’ e uma hipnótica versão de ‘How Soon Is Now’, com destaque para a finalização no gongo e bumbo do baterista Matt Walker. Curiosamente, essas três únicas faixas dos Smiths no repertório foram lançadas apenas como single na época – mas depois entraram em compilações.

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O foco era mesmo a carreira solo, um passeio pela discografia do cantor, mas sem valorizar os grandes hits. Do disco “Viva Hate”, por exemplo, entraram as pouco conhecidas do grande público ‘Break Up the Family’ e ‘Dial-a-Cliché’, enquanto o o megassucesso ‘Suedehead’ ficou de fora. ‘I Wish You Lonely’, ‘Spent the Day in Bed’ e ‘Jacky’s Only Happy When She’s Up on the Stage’ foram as faixas que representaram o último álbum.

A novidade foi o (ótimo) cover de ‘Back On the Chain Gang’ dos Pretenders, lançado há uma semana. Antes de executar a música, Morrissey, que é grande amigo da vocalista Chrissie Hynde, anunciou “todo todo” que o single alcançou o topo da parada no Reino Unido. No telão, foto de Chrissie quando jovem. Por sinal, ela fez uma bela versão de ‘Everyday is Like Sunday’ nos anos 90.

Dessa vez não houve a sessão tortura para traumatizar carnívoros de ‘Meat Is Murder’. A faixa do álbum homônimo dos Smiths servia de palanque para o cantor, tentar converter a plateia para sua causa de defesa dos animais, mostrando imagens cruéis de abatedouros – e causando mal-estar em muita gente. Dessa vez foi mais “light”. Durante a música ‘The Bullfighter Dies’ eram exibidas cenas de touradas em que os animais sofrem maus tratos, e também quando o toureiro se estrepa.

Houve homenagem a Joey e Dee Dee Ramone que apareceram no telão em ‘Hold On to Your Friends’. A  tragédia aérea de 1958 que matou o time do Manchester United foi lembrada com ‘Munich Air Disaster 1958’.

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O maior hit do setlist ficou para o bis. ‘Everyday Is Like Sunday’ foi acompanhada em coro pelo público e a noite se encerrou com ‘First of the Gang to Die’, sucesso do álbum “You Are The Quarry” que também teve recepção efusiva.

“Morrissey Paz-e-Amor” não abre mão de usar e abusar de sua aura mítica junto aos fãs. Além da presença e domínio de palco indiscutíveis, também sabe ser acessível. Apertou a mão de vários felizardos do gargarejo, autografou capas de discos de vinil e rasgou a camisa que usava (exibindo uma boa forma aos 60) jogando-a para plateia, causando uma voraz disputa por um pedacinho de pano que fosse. Ele sabe alternar na medida certa a pose de astro com o afago.

Apesar de já ser a quarta vez no Brasil, ele ainda parece se confundir com a semelhança do português com o espanhol. Quem se saiu melhor  foi o guitarrista Boz Boorer, que conseguiu arranhar um “obrigado”. E a voz continua impecável, parecendo disposto a se consolidar como um “Frank Sinatra indie”. Controvérsias à parte, Morrissey sempre soube fazer valer o ingresso.

*Foto: Marcelo Theobald / Agência O Globo (Reprodução)

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