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A nova Liga Extraordinária

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A expectativa para este álbum era grande. Há seis anos a mente de Alan Moore e o traço de Kevin O’Neill não nos presenteava com os heróis da era vitoriana conhecida como The League of Extraordinary Gentleman, ou em bom português como A Liga Extraordinária. Lançamento da Devir, Século 1910 (Century: 1910, tradução de Marquito Maia), abre o terceiro arco de histórias com o grupo, seguindo o estilo dos dois volumes anteriores e da graphic novel inédita The Black Dossier.

Essa nova saga consolida ainda mais o trabalho de Moore como escritor, em especial pelo uso massivo de referências literárias e culturais. No volume I (1999) fomos apresentados a esse grupo heterogêneo de agentes secretos, formado com personagens clássicos da literatura fantástica do século XIX. Como uma espécie de Liga da Justiça da era vitoriana, a equipe foi formada para conter e aniquilar ameaças extremas. Mina Murray, a noiva de Drácula de Bram Stoker, Alan Quatermain de As Minas do Rei Salomão, Capitão Nemo de 20 mil Léguas Submarinas, Dr Henry Jekyll e Sr. Edward Hyde de O Médico e o Monstro e Hawley Griffin de O Homem-Invísivel foram os principais personagens dos dois primeiros volumes.

Agora, doze anos após a fracassada invasão marciana, Mina Murray novamente é convocada pela Inteligência Britânica, sob a tutela de Mycroft Holmes, para desvendar o mistério por trás de uma sociedade secreta, o nascimento de uma criança que pode representar o fim do Império, a filha desaparecida do Capitão Nemo e o possível fim de tudo. Ao seu lado, uma nova equipe: o filho de Alan Quatermain, o ladrão reformado Arthur Raffles, o investigador do sobrenatural Thomas Carnacki e o andrógino guerreiro Orlando. Juntos enfrentarão perigos como a destruição de Londres e o retorno do mais famoso assassino de mulheres de toda a história, e viverão fatos históricos, como a coroação do rei e a passagem do cometa Halley. Esse é o argumento de O que mantém viva a humanidade?, título da história que abre a edição, um novo século e uma nova formação da equipe.

A narrativa se passa em 1910, ano que marca o fim do reinado de Edward VII e a coroação de um novo rei, George V. No horizonte, a Grande Guerra sussurrava próxima, prevendo o fim definitivo daquele período. A liga segue os sonhos premonitórios de Carnacki, que envolvem o culto da criança-da-lua de Oliver Haddo e o retorno à cidade de Jack Macheath. Enquanto isso, numa trama paralela, a filha do Capitão Nemo, Janni, chega a Londres na esperança de escapar do desejo de seu pai que ela fosse sua sucessora.

Moore concedeu ao arco narrativo um cenário pós-moderno onde uma conspiração global se prolongará durante todo o século XX e além, engendrada nesse primeiro volume com uma segunda parte em 1969 e a última em 2009, ambos títulos já agendados para publicação em 2011 e 2012, respectivamente. O autor prometeu ir além da literatura, inserindo nelas referências oriundas do teatro, cinema, televisão e música popular. Mas o principal objetivo da narrativa é a construção dos personagens, que por sinal é perfeita. A relação entre os mesmos é tão bem desenvolvida dentro do contexto geral que Moore insere suas inúmeras referências unindo cada uma com argamassa, como um Tolkien engendrando a Terra Média.

Em comparação ao volume 2 e ao The Black Dossier, a história é razoavelmente mais atraente, embora permaneça confusa e curiosa pelo massivo referencial literário e de cultura pop.  Nos dois primeiros volumes foram ambientados só personagens conhecidos, agora Moore pega pesado, desenterrando literalmente personagens desconhecidos do grande público, dando verdadeiros nós, cruzando, entrecruzando referências diversas como os três novos recrutas, que detalharemos a seguir.

Thomas Carnacki é um detetive criado pelo escritor britânico William Hope Hodgson (1877-1918) em 1910 para um periódico. Carnacki é uma espécie de caçador de fantasmas e monstros com dons místicos e equipado com uma parafernália para expulsar os seres do Além. Hodgson é considerado pioneiro no gênero aventura que mescla investigações policias com o sobrenatural. Já A.J.Raffles é um típico anti-herói, um mestre dos disfarces, formulado pelo cunhado de Arthur Conan Doyle, Ernest William Hornung (1866- 1921). O personagem é rico e elegante, vive como um Robin Hood moderno, que rouba dos milionários “matando o tédio” – dentre os quais seus colegas da alta sociedade londrina – para torrar a grana em mulheres, festas e presentes. Por último, o célebre imortal Orlando, criado pela renomada escritora Virginia Woolf em 1928, no livro Orlando, uma biografia. É um personagem que não envelhece desde o século XVII, mas que estranhamente se metamorfoseia em mulher e vice-versa. Cultuado pelos literários, Orlando foi amparado por diversas interpretações, dos movimentos feministas aos transexuais, até as adaptações cinematográficas e teatrais. E não fica só nesses três personagens, cada página e quadro tem referencial para serem pesquisados e analisados a parte.

Outra característica é a violência e perversões sexuais contra as mulheres, temas recorrentes nas narrativas de Moore. Para citar alguns exemplos, temos Lost Girls e Watchmen, e ao longo dos volumes a Liga repetidamente segue a mesma fórmula, aqui representando a natureza da sociedade vitoriana. Outra perspectiva que vale a pensa ressaltar neste último álbum é a maneira que o autor usa a música, baseando parte da trama na clássica A Ópera dos Três Vinténs de Bertold Brecht e Kurt Well, que retrata a Soho miserável da era vitoriana, com seus ladrões, bêbados e prostitutas.

A arte de O’Neill segue maravilhosa, com traços sutis a cada cena e que de repente cresce numa tomada bem maior da paisagem, ampliando a visão do conjunto em belíssimos e curiosos planos de fundo. Por fim, pegue seus quadrinhos e vá a Rio Comicon em novembro que O’Neill o aguarda para um possível autógrafo do próprio punho do desenhista.

Concluindo, uma das melhores séries em quadrinhos já criadas, com personagens curiosos e uma trama complexa que diverte e cativa qualquer amante da nona arte.

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Cadorno Teles -

Cearense de Amontada, um apaixonado pelo conhecimento, licenciado em Ciências Biológicas e em Física, Historiador de formação, idealizador da Biblioteca Canto do Piririguá. Membro do NALAP e do Conselho Editorial da Kawo Kabiyesile, mestre de RPG em vários sistemas, ler e assiste de tudo.

2 Comentários

  • alan moore sem duvida é um dos melhores escritores do final do seculo passado ,como jodorowski e françois burgeon ,ele enxerga o formato das hq em seu estado primario ,sua mente se assemelha a um balde de tinta e sua mãos no lugar dos dedos a pincéis e maquinas de escrever ,v de vingança é um coquetel de ideias anarquistas em favor dos anseios humanos perante a perda da civilidade , nunca visto numa historia em quadrinhos ,miracleman é o superman escrito por nietzche,monstro do pantano é uma longa jornada ,tortuosa e sombria que prova que não existe horror piór do que a maldade humana ,watchmen nada mais é do que a cronica definitiva de que a evolução estetica nada tem a ver com o humanismo e as emoções tão caros ao homen moderno,se seguirmos essa cronologia ,veremos que sua preocupações como escritor jamais exclui o fator humano ,seja em historias de super heroi ,ficção cientifica ou dramas ,moore mirou seus olhos para o mercado americano por que sabia que ali se podia plantar frondosos frutos ,ele arrancou de forma violenta as fraldas dos comics americanos e a chibatadas o obrigou a usar calças.

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