"Meu amigo Dahmer" traz um perfil desolado de um futuro serial killer  – Ambrosia

“Meu amigo Dahmer” traz um perfil desolado de um futuro serial killer 

Os serial killers e psycho killers são um fenômeno que atrai curiosos devido ao horror que trazem em seu cerne. O interessante de diversos relatos, livros, estudos e filmes é a tentativa dentro de uma perspectiva real e tangível, de entrar na mente do atroz e cruel assassino.  E a essa vontade de tentar compreender e sentir o horror por trás de nomes como O Açougueiro de Rostov, O caçador de Ruher, Dating Game Killer, O Homem dos Doces entre outros não é novidade, como já vimos em diversas obras. E agora neste Meu amigo Dahmer, lançado pela DarkSide, temos mais uma adição às obras sobre esses ‘monstros’. Lembrando que uma adaptação cinematográfica está saindo, dirigida por Marc Meyers, com Ross Lynch no papel do Canibal de Milwaukee.

A graphic novel é obra do quadrinista e jornalista estadunidense Derf Backderf e trata de um colega de escola e vizinho de sua localidade natal em Ohio, Jeffrey Dahmer, que ficaria conhecido pelo topônimo do parágrafo anterior.  Um autêntico serial killer, acusado da morte de 17 jovens que sequestrou e violou pelo canibalismo e necrofilia.

Para Derf Backderf desenvolver Meu amigo Dahmer foi um processo que levou quase vinte anos desde a data exata de 22 de julho de 1991 quando Jeffrey Dahmer foi detido por seus crimes e o mundo descobriu os segredos obscuros que se escondia ante o semblante tímido e solitário. Desde esse momento, Backderf viu que os meios de comunicação estavam passando por alto uma história que merecia ser contada e que ele podia contar algumas coisas pela relação que manteve com seu inquietante amigo.

O primeiro relato que o autor fez saiu em 1997, na revista alternativa Zero Zero (Fantagraphics Books), para posteriormente editar em 2002 uma versão maior, mas que conseguiu demonstrar seu potencial com uma nomeação ao Eisner. O que levou a presente narrativa gráfica, publicada em 2012 pela  Abrams Comic Arts nos EUA. O resultado final nos conta uma crônica da juventude de Jeffrey Dahmer com um olhar realmente próximo, uma memória direta de seu autor, baseada em suas recordações e nas lembranças que seus amigos e companheiros da época contrastadas com as declarações de seu protagonista e da policia, assim como de outros familiares, vizinhos, professores e conhecidos.

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O próprio Derf Backderf, autor de corte underground, cujo traço poderia ser o fruto bastardo da arte que Robert Crumb e Peter Bagge consolidaram, conhecido em seu país pela tirinha The City e as narrativas gráficas inéditas no Brasil Trashed e Punk Rock and Trailer Parks, considera Meu amigo Dahmer como “uma graphic novel que detalha o descenso de Jeff desde quando tinha doze anos passando pela adolescência conflituosa, para se tronar um miserável pervertido cuja depravação alcançou o incompreensível”. A visão que o autor imprime, ao dar uma perspectiva que aborda as origens psicológicas deste homicida, enquanto aborda suas próprias impressões e teorias sobre o protagonista de sua história é o que mais me atraiu nesta obra. O traço de Backderf reflete um espelho deformado, ou seja, nos engana a primeira vista com a maneira caricaturesca como Crumb faz, mas que acaba sintetizando as insanas emoções humanas.

Derf defende, ao longo da narrativa, que Jeffrey Dahmer não teria se convertido no monstro que acabou sendo se tivesse compartilhado seus problemas e temores com alguém e não carregasse a indiferença que todos tinham com ele. Mas acredito que o autor esqueceu deliberadamente o papel que a adolescência tem em muitos dos jovens, em que, para o bem e para o mal, as amizades e quem os rodeiam tratam alguns momentos de maneira sem responsabilidade, lavando as mãos, apontando o dedo, só por diversão. Assim, em Meu amigo Dahmer esboça-se certa consciência que não se materializa plenamente, mesmo quando verificamos como ele e seus colegas tratavam Dahmer como um mascote, usando isso como conveniência, como também seus pais fizeram no divórcio. Este perfil psicológico modelado pelo autor parece dizer mais sobre sua pessoa que sobre o protagonista de sua história, embora a maioria das coisas contadas em Meu amigo Dahmer se baseia nas experiências de terceiros e não nas suas próprias, somado a um trabalho de investigação.

Em meio ao ponto de que não se pode escapar tão facilmente da influência de certos elementos e aspectos da vida, encontramos no máximo, a desolação em sua vida. Dahmer era um menino solitário, tímido e um pouco estranho que acabaria sendo conhecido como o Butcher Milwaukee, com uma infância na qual não há provas de maus tratos físicos ou psíquicos, nem traços de uma adolescência traumática, como geralmente é habitual e recorrente em muitos casos de assassinos em série conhecidos.

A proposta aqui é conhecer o primeiro ato da tragédia, desenhando o panorama que serviu para cultivar um assassino em série, tentando deduzir, construindo, quase sem querer, um thriller denso e sombrio cheio de humanidade em que Derf Backderf não tenta descobrir quem é o assassino, mas como ele veio a ser, aliviando, sempre com base em suas impressões pessoais, possíveis razões, lógicas ou não, compreensíveis ou não, para levar Jeffrey Dahmer a seguir o caminho que eventualmente marcaria seu destino. O retrato resultante lança alguma luz sobre a personalidade desse personagem, um cara retráido e atormentado por seus próprios demônios, no qual ele acabou descobrindo um caráter obsessivo, controlador e extremamente manipulador ao qual seus problemas com álcool e maconha não lhe beneficiaram.

Em definitivo, a graphic novel que abre o selo de quadrinhos da DarkSide é um interessante “na mente de um assassino”, com uma mistura do cotidiano de virtudes e defeitos traduzida em tons que eludem o simples e o rotineiro de uma vida como qualquer outra.

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