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"Capitã Marvel" não alcança todo o seu poder no cinema, mas ainda assim funciona

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Ao final de “Vingadores: Guerra Infinita”, o público, ainda em choque com os efeitos das ações do vilão Thanos (magistralmente interpretado por Josh Brolin), era apresentado a um símbolo diferente durante uma das cenas pós-créditos, que apenas os fãs de quadrinhos souberam do que se tratava. Logo, ao acender das luzes do cinema, o público começou a fazer perguntas como: “Que emblema era aquele?”, “O que ele significa?” “O que isso tem a ver com o que aconteceu no filme?”

A Marvel Studios, espertamente, usou esse enigma pois queria criar mais expectativa para introduzir uma personagem que ainda não tinha sido vista no seu universo cinematográfico e que poderia ser crucial para combater o vilão em “Vingadores: Ultimato”, a sequência direta para “Guerra Inifinta”. A ideia deu certo porque “Capitã Marvel” (“Captain Marvel”, EUA, 2019) acabou se tornando um dos filmes mais esperados do ano, mesmo não sendo estrelado por uma heroína que conta com um número maciço de admiradores. Afinal, todos querem saber se ela realmente tem condições de encarar o Titã Louco.

Pelo que é mostrado na nova produção, a personagem tem, sim, poder suficiente para causar um belo estrago no temido antagonista no futuro. Mas o filme que a introduz apresenta algumas inconsistências que acabam prejudicando o resultado final, que tinha potencial de sobra para ser muito melhor. Mesmo assim, deve satisfazer boa parte dos espectadores.

A trama é centrada em Vers (Brie Larson), uma integrante da Starforce, um esquadrão de elite da raça kree, que vive no planeta Hala e vive em constante guerra contra os skrulls, seres cuja principal habilidade é imitar a aparência física de outra pessoa, até mesmo o seu DNA. Ela é treinada por Yon-Rogg (Jude Law), o líder do seu grupo e seu mentor para se aprimorar como guerreira. Durante uma operação de resgate, ela acaba caindo no planeta Terra do ano de 1995 e descobre que há também um grupo de skrulls, liderados por Talos (Ben Mendehlson).

Disposta a descobrir os planos dos inimigos, Vers acaba fazendo uma parceria com Nick Fury (Samuel L. Jackson), que ainda não era o chefão da S.H.I.E.L.D. na época, mas apenas um simples agente. Paralelo a isso, ela tenta desvendar o que há por trás de imagens que surgem em sua mente, que podem elucidar o mistério sobre sua origem e a levam até a piloto de aviões Maria Rambeau (Lashana Lynch), alguém que tem muitas respostas em relação ao seu passado.

Com o grande sucesso de “Mulher Maravilha”, da rival DC/Warner, que consagrou a atriz Gal Gadot e a diretora Patty Jenkins, a Marvel Studios deu o sinal verde para a primeira aventura protagonizada por uma personagem feminina, que hoje é considerada uma das mais poderosas dos quadrinhos da Casa das Ideias. No entanto, “Capitã Marvel” fica um pouco abaixo do que o esperado, principalmente por causa da direção de
Anna Boden (primeira mulher a dirigir uma aventura no MCU) e Ryan Fleck, que não conseguem sair do tradicional, principalmente nas cenas mais dramáticas, que careciam de maior impacto. As sequências de ação até são boas, especialmente as da parte final da trama, mas não chegam a ser inovadoras ou memoráveis.

O principal problema está no roteiro, escrito pelos cineastas e Geneva Robertson-Dworet (a partir de um argumento criado pelo trio junto com Nicole Perlman e Meg LeFauve). Há momentos realmente empolgantes, mas até chegar a eles o espectador tem que passar por cenas um pouco arrastadas e com diálogos muito expositivos, que deixam o filme com um ritmo irregular. Além disso, o script possui uma reviravolta que pode incomodar principalmente os leitores de quadrinhos que conhecem mais sobre o universo da personagem. Mas quem não sabe maiores detalhes ou simplesmente não se incomoda com mudanças certamente irá curtir.

A respeito da parte técnica, “Capitã Marvel” possui ótimos efeitos visuais, em destaque aos que evidenciam a grandeza dos poderes da heroína, o rejuvenescimento de alguns personagens (como Nick Fury e o agente Coulson, novamente vivido por Clark Gregg) e as que mostram as metamorfoses dos skrulls.

Os vilões, aliás, são muito bem representados pela maquiagem, que os torna bastante verossímeis. O único porém está na fotografia escura demais, principalmente nas cenas ambientadas no espaço sideral e no interior das naves, onde é difícil ver alguma coisa, especialmente nas sequências de luta. Se o filme fosse de uma produtora pequena com pouco orçamento, seria justificável, para não evidenciar o pouco dinheiro investido. Mas numa produção de um blockbuster como esse, não dá para entender o motivo.

Para que o filme funcionasse, era necessário que a protagonista fosse muito bem defendida pela atriz escolhida para o papel e, felizmente, Brie Larson consegue superar esse desafio. A vencedora do Oscar por sua performance em “O Quarto de Jack” pode não ter um grande carisma, mas convence em sua performance de uma mulher que está em busca de respostas sobre suas origens e consegue dar um ar levemente irônico que faz com que ela seja uma personagem agradável, além de se sair muito bem na fisicalidade.

Contudo, quem rouba todas as cenas que aparece é mesmo Samuel L Jackson. Além de divertir ao mostrar um Nick Fury ainda inexperiente e capaz de cometer falhas, bem diferente da imagem de durão e sabichão que foi construída nos últimos dez anos, o ator desenvolve uma ótima química com Larson e bate uma bola redonda com ela o filme inteiro. Isso sem falar no gato Goose, que sempre chama a atenção quando aparece e vai deixar muitos amantes de felinos com um sorriso grande no rosto.

O restante do elenco também não compromete. Jude Law convence como líder da Starforce e o instrutor da Capitã e passa adequadamente a sua ambiguidade. Ben Mendelsohn, cada vez mais solicitado para fazer antagonistas, desta vez tem um material mais consistente para construir Talos e torna seu skrull um personagem com muito mais camadas do que estamos acostumados a ver nos vilões da Marvel, mesmo que não seja tão marcante quanto Loki, Kilmonger ou mesmo o Abutre. Ainda assim, ele se torna mais interessante à medida que a trama avança.

Lashana Lynch também se sai bem como a piloto Maria Rambeau, embora não faça nada além do esperado. Já Annette Bening, que há tempos não aparecia num blockbuster, mostra seu habitual talento ao fazer uma personagem importantíssima para a história e que não será revelada aqui sua identidade para não estragar a surpresa.

Com uma ótima trilha de canções dos anos 1990, que evidencia as músicas interpretadas por cantoras ou bandas lideradas por mulheres como Garbage, Elastica e Hole (só faltaram as Spice Girls), cujas letras giram em torno (felizmente) do Girl Power, “Capitã Marvel” mostra que, sim, é possível ter filmes estrelados por super heroínas, que, assim como “Pantera Negra” foi para os espectadores afrodescendentes, é uma obra que pode ser representativa para o público feminino. Só precisa ter um acabamento melhor no roteiro e na direção em produções futuras. De qualquer forma, a Capitã está entre nós. Seja muito bem-vinda.

Ah, sim!!! O filme tem duas cenas pós-créditos. Vale ficar no cinema até o fim da projeção, principalmente a primeira.

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