Se há um assunto que fascina a ficção, seja na literatura, no cinema ou na TV, é o que acontece nos bastidores do Vaticano. Os segredos guardados a sete chaves por aqueles que zelam pelos dogmas que definem a conduta de milhões de fiéis ao redor do globo geram uma inevitável especulação por parte das pessoas, girando em torno da idoneidade dos membros da que ainda é a instituição mais poderosa do mundo. “Conclave” chega oferecendo um thriller de investigação que percorre os corredores e portas fechadas no Vaticano sofisticado de forma envolvente e intrigante.
Com a morte do Papa, o colégio de cardeais precisa se reunir para decidir quem será o novo pontífice. Thomas Lawrence (Ralph Fiennes), conhecido também como Cardeal Lomeli, é o encarregado de executar essa reunião confidencial após a morte inesperada do líder da Igreja Católica. Lawrence não entende exatamente por que foi escolhido a dedo para conduzir o conclave como última ordem do papa antes de morrer. Daí, os líderes mais poderosos da Igreja Católica vindos do mundo todo se reúnem para participar da seleção e decidir sobre as opções, mas sempre observando seus próprios interesses. Lawrence acaba se vendo no centro de uma conspiração e descobre um segredo do falecido pontífice que pode abalar os próprios alicerces da Igreja. Não somente a fé está em jogo, mas os próprios alicerces da instituição diante de uma série de reviravoltas que vão surgindo durante essa assembleia sigilosa.

Em “Conclave”, acompanhamos um dos eventos mais secretos do mundo, que é a escolha de um novo Papa. O que está por trás daquela fumaça revelando o Habemus Papam, que é a única coisa que o mundo externo consegue enxergar do processo de eleição. O diretor Edward Berger (“Nada de Novo no Front”) constrói um ambiente claustrofóbico ao nos levar com sua câmera por aqueles halls suntuosos, quartos secretos e a sensação angustiante toda vez que uma porta se fecha. A geometria do cenário é explorada de forma arrojada, e a disposição de elementos sempre indica algo que está ocorrendo ou prestes a ocorrer. O trabalho de fotografia de Stéphane Fontaine (“Jackie”, “Capitão Fantástico”) reforça a suntuosidade dos cenários, mas também é cúmplice dos momentos mais intimistas, como se também diminuísse o escopo.

O roteiro de Peter Straughan (“O Homem Que Sabia Demais”) adapta, de forma bastante fiel, o romance de Robert Harris de 2016 e consegue justamente reproduzir a mesma construção envolvente estabelecida pelo romancista. As rodadas de votação, as contagens de votos são mostradas de forma melancólica. Toda a solenidade em torno dos rituais é mostrada de forma pomposa não para enaltecer, mas como uma indagação se tudo aquilo teria mesmo utilidade, questionando a verdadeira necessidade da tradição. Mas para esses homens tem significado, e isso basta.
Ralph Fiennes transmite em cada gesto, aceno ou expressão o peso que carrega sobre os ombros. A condução da reunião à medida que temos informações, vai ganhando cada vez mais contornos de via crucis. E ele precisa ser justo, imparcial e equilibrado. No entanto, Thomas possui aliança com Aldo Bellini (Stanley Tucci), um progressista que vê uma Igreja mais aberta como único caminho para ampliação de influência. Do outro lado está Goffredo Tedesco (Sergio Castellitto), um italiano reacionário que acredita que além de achar que a instituição está se posicionando de forma equivocada e defende até a volta da Missa em latim como era usual até os anos 1960. Mas o cabo de guerra não é tão simples, com dois extremos em conflito. Há outros candidatos, como Joseph Tremblay (John Lithgow), que se mostra um político astuto, apesar de sua aparente humildade e fala mansa, demonstra claras ambições. Joshua Adeyemi (Lucian Msamati), um carismático cardeal nigeriano com chances de se tornar o primeiro papa negro, o que já o tornaria, de alguma forma, vítima de artimanhas políticas. Uma peça fundamental na engrenagem é a Irmã Agnes, brilhante mente interpretada por Isabella Rossellini.

“Conclave” pode não ser inovador ao especular sobre os segredos da Igreja Católica, mas sem dúvidas é um dos filmes que o fizeram da forma mais engenhosa recentemente. A direção segura e atuações impecáveis de rigorosamente todo o elenco garantem um espetáculo cinematográfico memorável.
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