Hoje no Festival do Rio aconteceu uma daquelas simbioses entre o Cinema e a urgência da realidade. A Cinelândia, no Centro do Rio, onde está o imponente cinema Odeon, estava tomada pelo caos com bombas, depredações e muita confusão entre manifestantes – profissionais da educação reivindicando que seus ofícios seja tratados com mínimo de decência institucional – e a Polícia.
O tapete vermelho que antecede a sessão, claro, não aconteceu, o que é até coerente com o tipo de filme politicamente iconoclasta do diretor Sérgio Bianchi. A imprensa e os convidados foram praticamente empurrados para dentro da grande sala pela produção, devido o risco da confusão externa adentrar os limites do Odeon. O diretor ainda chegou a manifestar contra a PM antes de seu filme, que, numa coincidência direta, falava muito sobre a apatia política e o conflito ideológico dos novos tempos.
“Jogo das Decapitações” parte da noção de que “a esquerda é um esporte da burguesia”, e vai fundo na crítica corrosiva às implicações do termo. A trama acompanha Leandro (Fernando Alves Pinto), um estudante de mestrado. Ele pesquisa os movimentos sociais da época da Ditadura, mas seus estudo são interrompidos pela notícia da morte do cineasta Jairo Mendes (Paulo César Peréio). O acontecimento traz a Leandro uma nova obsessão: achar o filme censurado deixado pelo diretor transgressor. Atacando questões como as indenizações às vítimas de tortura na Ditadura Militar, o filme foi feito antes da onda de protestos hoje espalhada pelo Brasil. Há um ano, o cineasta paranaense rodou em São Paulo, onde vive, sequências de passeatas similares às que contagiam o país. Essa pertinência engradece ainda mais a parábola de Bianchi que, dentro do que se propõe é efetivo, mesmo perdendo um pouco o fôlego em seu terço final.
O discursos é direto e o trato à sua dramaturgia não foi esquecido. Na verdade, o cinema do diretor, ensaístico por natureza, é debochado e impiedoso na ímpeto de fazer a plateia refletir e, quem sabe, reagir. O protesto de Bianchi estava pronto do lado de dentro do Cinema…
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