Sinopse: Mariel quer interpretar Isabella em “Medida por Medida” de Shakespeare. Luciana, que também é atriz, agora renomada, que sempre a ofuscou; a ajuda a ensaiar o papel. Mas durante a audição, Mariel percebe que Luciana está se candidatando ao mesmo papel.
Análise
Isabella (2020) foi escrito e dirigido pelo argentino Matías Piñeiro. Sua crescente reputação e sua posição em um cinema bastante independente são talvez as principais características de sua filmografia. O cineasta aqui se interessa nos dramas do escritor inglês para enveredar numa produção intrincada em metalinguagem.
Apoiando-se no imaginário shakespeariano, o diretor intercala seu roteiro sobre as dúvidas que sentimos, o que queremos e não podemos, frente a abandonar um sonho.
Isabella é como o A Liberdade é Azul de Krzysztof Kieślowski, perpassa os princípios básicos da narrativa audiovisual. Sem um ritmo narrativo claro, ele experimenta com metalinguagem as transições de cena; um trabalho de estudo pessoal sobre a protagonista e, por sua vez, sobre o próprio diretor.
Cabra D’água, um super-herói genuinamente nosso
María Villar é Mariel, uma atriz que, como Isabella na peça que dá origem a todo o filme, Medida por Medida (1603-1604), tem um conflito com seu irmão de uma forma que define sua jornada interior e busca isso numa uma performance teatral.
O diretor argentino estabelece um acordo com seu público no qual tudo deve ser lido em dois sentidos e relata o que acontece no plano literal – a busca de Mariel para superar suas dúvidas e medos, e fazer com que eles a escalem como Isabella ; a relação com sua «concorrente», Luciana, que por sua vez é amante de seu irmão – com as premissas da própria Medida por Medida , que propunha o dilema de salvar a vida de um irmão pagando o preço de ver a própria vida transformada em inferno.
As conversas que Mariel e Luciana têm dessa forma, definir e contextualizar a obra, mas não no plano estritamente literal, mas através da busca da mensagem em todas as suas decisões de estilo. Assim, a construção do filme não é nada simples; a montagem, sem um fio condutor claro, pode acabar cansando o espectador. Perdemos até a noção do tempo; uma ótima maneira de expor o espectador a todo o dilema do filme desde o início. É um requinte pela confusão da temporalidade.
Ao colocar cada peça de montagem em um lugar diferente, acessamos uma cronologia que é mais relevante para o espectador graças a essa anarquia: entendendo as dúvidas e medos de Mariel , sua maternidade – a veremos grávida às vezes, outras não; seu senso de inferioridade e sua criatividade paralisada se completa no caos, como um quebra-cabeça de peças desordenadas que só se completa com a perplexidade.
A simbiose perfeita
O argentino externaliza sua obra entre a forma e a substância, criando uma simbiose perfeita que permite compreender o sentido geral de seu filme. Podemos terminar dizendo que as 12 pedras que Mariel atira na água, cada uma representando um fragmento de dúvida dissipada, tornam-se com o passar do tempo um convite constante para participar daquela provocação. As entrelinhas, o valor subtextual nos obriga a nos perguntar, como Mariel faz em seu papel: duvidar. Isabella é um lembrete maravilhoso de que o cinema é mais interior do que visível.
Nota: Bom – 3 de 5 estrela
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