Rua do Medo – Netflix traz uma trilogia que enriquece o gênero do terror juvenil

Rua do Medo (Fear Street, 2021) se tornou um evento, após sua conclusão, deixando no catálogo da Netflix um surpreendente afresco com diferentes encarnações do terror juvenil  de RL Stine. Um evento por focar na geração streaming, numa reprodução em pastiche – no melhor sentido da palavra – de assassinos, bruxaria, forças paranormais e amores proibidos do Ensino Médio.

Tudo que Rua do Medo apresentou é algo que já vimos várias vezes, e não veio para criar um Pennywise ou Jason Todd, nem influir no gênero do terror do futuro ou do passado, mas sim desenvolver e completar a história épica de Shadyside através da relação de duas meninas que devem investigar como se livrar da terrível influência de uma bruxa chamada Sara Fier e suas consequências: possessões, assassinatos de todos os tipos e tragédias que marcam a história da cidade.

Rua do Medo – Netflix traz uma trilogia que enriquece o gênero do terror juvenil – Ambrosia

A diretora Leigh Janiak aborda o trabalho como uma oportunidade de expressar tudo o que gosta sobre o material de referência, e consegue uma comunhão inusitada entre o produto voltado para um público verdadeiramente jovem – não para adultos com protagonistas adolescentes – com uma classificação R, o que dá uma liberdade de oferecer mortes sangrentas, sexo sem o puritanismo associado a essas produções e também em brincar com a ideia nostálgica como uma oportunidade para exaltar a estética, música e tiques culturais das diferentes épocas que interpreta.

Cada parte merece uma análise e por fim, uma conclusão sobre a trilogia em si.

Os anos 1990

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Rua do Medo 1994 – parte 1 (The street of terror part 1: 1994) é um extrovertido início para a trilogia que atualiza a famosa coleção de livros de RL Stine para a era Stranger Things sem fazer nenhuma adaptação em particular. Além do primeiro ato de um grande filme, a história proposta é completamente nova, mas contém todos os elementos típicos da literatura do criador de Goosebumps. O cenário dos anos 1990 é um exercício de nostalgia, que aproveita o seu ponto de partida para propor uma homenagem a Pânico (Scream,1996), bem melhor do que a própria série de filmes oficiais.

A parte 1 funciona um pouco como um slasher com twist sobrenatural, onde não falta mortes com muito gore –bem surpreendente dado o público objetivo – e um terror com maldições centenárias, possessões e mortes sangrentas, lembrando Linha Mortal (Flatliners, 1990), Halloween (1978) e Violência e Terror (Intruder, 1989).

Neste primeiro encontro com a trilogia, temos um acabamento televisivo que revela mais um conceito de minissérie dividida em três do que algo que poderia sair no cinema; alguns desencontros de pós-produção e o uso duvidoso da música de Marco Beltrami às vezes deixa a impressão de pressa. Mas Janiak, que completou toda a trilogia, entende os mecanismos do gênero e traz uma diversão despreocupada, com violência irreverente e o uso das canções da época com intuição e intencionalidade.

Os anos 1970

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Com a segunda parte da trilogia, 1978: Parte 2, fica claro que cada um deles é uma mesma história dividida em três atos, sobre segredos entre duas cidades vizinhas e uma maldição, que aqui vem com quase duas horas, duração pesada em um produto dessas características, mas que funciona muito bem, especialmente neste segmento ambientado nos anos 70.

1978 conta a história de uma sobrevivente de um massacre, que se desenvolve nos anos 1970 em Camp Nightwing – o mesmo local de Sexa-Feira 13 parte VI. Esse cenário é o local de férias para jovens das duas comunidades, onde as atividades logo serão interrompidas pelo rompante de um dos residentes que começa a assassinar quem encontra. É uma clara reinterpretação juvenil dos slashers da idade de ouro como, obviamente, Sexta-feira 13 (1980).

Mas a diretora conhece bem o gênero e deixa detalhes que vão além do título mais famoso, como Chamas da Morte (The Burning, 1981) e Acampamento Sinistro (Bloody Camp, 1983), nos oferecendo um episódio brutal, bem melhor finalizado que 1994, com muito sangue e sexo, trazendo o espírito do final da década cheirar a embriaguez, trapaças e busca de liberdade. Com bem mais mortes, inclusive infanticídio; mais ritmo, a história da maldição é expandida com elementos fantásticos da lógica narrativa de Stine.

Além dos assassinos, temos aparições, cavernas escondidas e misteriosas massas viscosas em altares satânicos escondidos. Além disso, novamente o bom uso da música da época, fazendo um eco brilhante com uma certa música de David Bowie que reflete nas cenas finais de sangria.

A origem de tudo

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Parte 3: 1666 é o capítulo final da trilogia, reutilizando o flashback para nos levar ao tempo dos Puritanos e mostrar a origem da maldição, revelando todos os segredos que fecham o círculo, perfazendo os três episódios uma história sólida com várias interligações . Desta vez, voltamos a Shadyshide quando é apenas uma colônia onde coisas estranhas começam a acontecer, seguindo o padrão de histórias clássicas de caça às bruxas, como As Bruxas de Salém (The Crucible, 1996).

Isso oferece uma mudança de padrão muito curiosa, com alguns momentos realmente pesados, como a cena inusitada na igreja cheia de crianças mortas e sem olhos ou o enforcamento da bruxa. Um outro tipo de terror dá textura ao cerne da história, tendo a origem de tudo o ódio das pessoas pelo diferente, aqui uma relação ainda não aceita nos dias de hoje.

Além disso, há algumas surpresas e o enredo é mais ou menos tecido junto com as demais linhas do tempo, sendo uma conspiração de assassinatos rituais a la O Segredo da Cabana (The Cabin in the Woods, 2012) o mote para toda a trilogia. Menos sangrento, mais parecido com Stranger Things, está cheio de armadilhas para os slashers ao ritmo de Offspring e The Pixies (que trilha sonora!) que dá no final um bom espírito de aventura.

Um evento sem precendentes

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A Morte Te Dá Parabéns (2017), Verdade ou Desafio (2018) ou Natal Sangrento (2019) miraram o público juvenil, mas dentro de clichês que engessavam suas histórias. Não conseguiram o que Rua do Medo faz: posar como um produto jovem quando na realidade é exatamente o que os pais não querem que eles vejam, o tipo de filme para uma sessão com amigos em segredo e que os tratem como adultos, que será um sucesso desde sua estreia.

Rua do Medo pode ser vista como um clichê de terror, uma aventura sombria ou uma fantasia nostálgica, até mesmo como uma bela história de amor através dos tempos, mas suas condições incomuns de lançamento nos leva aos grandes eventos televisivos de antigamente. E é um dos experimentos mais estimulantes do gênero recente, e vale a pena pelo todo.

Nota: Ótimo – 3,5 de 5 estrelas

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