Quando começaram a sair os primeiros anúncios de que sairia uma quarta parte de “Toy Story”, tanto tempo depois da terceira aventura (lançada em 2010), as perguntas que vieram à mente de muitos foram: “por quê?”, “para quê?” e “há alguma coisa a mais para mostrar?”. Afinal, “Toy Story 3” parecia o desfecho perfeito para a trilogia dos brinquedos criados pela Pixar. Mas, para a surpresa geral, “Toy Story 4” (idem, 2019) mostra que, sim, havia algo que, talvez, ninguém podia desconfiar que deveria ser contado desse universo.
Quando o filme acaba, o espectador tem a certeza de que valeu muito a pena terem produzido essa nova continuação, que encanta, diverte e, principalmente, traz de volta aquela criança que vive dentro de cada um de nós, sempre disposta a viver novas emoções com amigos que passaram a fazer parte da sua vida, ao longo dos anos.
Assim, a trama mostra como estão os outrora brinquedos de Andy, sempre liderados pelo caubói Woody e pelo astronauta Buzz Lightyear (novamente dublados na versão original por Tom Hanks e Tim Allen, respectivamente), depois que se mudaram para a casa da menina Bonnie, como foi mostrado no final de “Toy Story 3”. Até que um dia, durante o período de adaptação para o começo das aulas no jardim de infância, Bonnie cria o boneco Garfinho. Só que ele rejeita sua condição de brinquedo e Woody se dedica à tarefa de convencê-lo do contrário, e de sua importância para a garota.
As coisas mudam quando, durante uma viagem, o Garfinho foge e Woody tenta resgatá-lo e levá-lo de volta para a sua dona. No caminho, eles descobrem um antiquário perto de um parque de diversões, onde Woody reencontra Betty, a pastora de ovelhas (que apareceu nos dois primeiros filmes), que descobriu que não precisava mais pertencer a nenhuma criança. Só que, além de rever Betty, Woody acaba conhecendo novos brinquedos e se mete em novas confusões que podem tornar o seu retorno ainda mais complicado do que ele imaginava.
Em todos os filmes da franquia, o principal destaque está no desenvolvimento do roteiro e dos personagens e em “Toy Story 4”, isso não é diferente. O texto, escrito por Andrew Stanton e Stephany Folson, consegue a proeza de trabalhar algumas questões antigas, como a importância do brinquedo na vida das pessoas, da mesma maneira que trata novas, como a autoestima que cresce ou diminui dependendo da situação. Isso acontece principalmente entre os protagonistas Woody e Buzz (que ganha até uma divertida “voz interior” para motivá-lo a agir em alguns momentos da história).
Outra questão curiosa é como é tratada a questão da liberdade experimentada por Betty, aqui mostrada não mais como uma frágil pastora, mas sim uma boneca decidida e destemida, que aprendeu a ser empoderada com o passar do tempo, o que a torna a personagem ainda mais legal principalmente para o público feminino, que cada vez mais se identifica com personagens que representam essa mudança na sociedade, como a Mulher-Maravilha e a Capitã Marvel.
Outro ponto positivo do roteiro está no humor, muito bem representado pelo Garfinho, que poderia ser um personagem enjoado e pouco interessante, mas está incrivelmente engraçado, principalmente por sua ingenuidade. Além dele, há também a dupla formada por Coelhinho e Patinho (que ganham as vozes de Antonio Tabet e Marco Luque, respectivamente, na versão em português), que rendem muitos momentos engraçados, assim como Duke Caboom, o dublê canadense (na versão original dublado pelo atual “muso” da internet) Keanu Reeves, que adora se exibir em sua motocicleta. Esses novos personagens são tão carismáticos quanto os antigos e certamente ganharão a simpatia do público.
Se é para indicar algum porém em “Toy Story 4”, ele é representado pela vilã, a boneca Gabby Gabby, que não é tão imponente quanto os outros inimigos que surgiram nos filmes anteriores. Isso porque os roteiristas procuraram “humanizar” as intenções dela, a ponto do espectador não só sentir pena dela como até torcer para que ela consiga os seus objetivos. Pelo menos, os comparsas de Gabby Gabby, que são bonecos de ventríloquos, cumprem o objetivo de intimidar, com seu olhar sinistro. Faltou também um desfecho mais bombástico, como foi visto nos capítulos anteriores (principalmente no 3). Mas nada que desabone o resultado obtido pelo diretor Josh Cooley (um dos roteiristas do também sensacional “Divertida Mente”) e sua equipe.
Além da impecável qualidade técnica da animação e da computação gráfica (que tornam ainda mais realistas os cenários e os brinquedos, especialmente suas texturas), o maior destaque de “Toy Story 4” está na jornada emocional pela qual os personagens passam, principalmente Woody, Buzz, Betty e até mesmo o Garfinho, que toca o coração do público de maneira certeira e deixa o filme ainda mais envolvente e contagiante, à medida que a trama avança. Assim, quando chega ao seu desfecho, não tem como o espectador não se sentir tocado e não será surpresa se muitas pessoas saírem das sessões de cinema com os olhos vermelhos por causa das lágrimas que devem brotar. Neste aspecto, a Disney/Pixar mostra que ainda é imbatível quando precisa fazer do público o seu cúmplice.
No final das contas, “Toy Story 4” consegue a proeza de ser, talvez, a melhor quarta parte de qualquer franquia já existente no cinema, seja ela de animação ou live action. O filme tem grandes chances de se tornar a melhor animação de 2019 e não será surpresa se ficar entre os indicados para o Oscar do próximo ano. Embora ele represente o fim de uma era, não seria impossível uma volta a esse universo quando menos se esperar. Desde que, é claro, tenha uma história que valha a pena ser contada. Afinal, a imaginação pode ir ao infinito e além.
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