Ambrosia: Como foi o processo de fazer o livro? As crônicas já tinham sido escritas para a RUBEM e houve só um trabalho de compilar?
Marco Martire: Todas as crônicas do livro foram publicadas originalmente na revista eletrônica RUBEM, entre 2014 e 2017. De início, a ideia era fazer uma seleção dos primeiros três anos (2014/15/16), como uma espécie de celebração, uma edição comemorativa da efeméride. Minha estreia foi em janeiro de 2014. Desde então publico quinzenalmente e sem falta. Somei depois de três anos 72 crônicas publicadas, um número que justificava uma compilação e o livro. O projeto foi apresentado assim para a Editora Moinhos, quando ela abriu chamada para recebimento de originais em 2017.
Uma vez aceito o projeto, selecionei as crônicas que mais gostava e enviei. Começamos a trabalhar, formou-se então a parceria, algumas crônicas foram preteridas, outras, já de 2017, foram acrescentadas, chegando ao total de 48 crônicas neste “O gato na árvore”. Posso dizer que o trabalho transcorreu de forma muito gostosa, uma relação autor-editora bem gratificante, apesar da distância. A Editora Moinhos fica em Belo Horizonte, nossa comunicação foi realizada quase inteiramente por email.
A: Sua linguagem é ao mesmo tempo coloquial e poética. Qual tom você acha mais adequando à crônica? E por quê?
Marco: A crônica costuma exibir essa identidade de conciliar várias características que aparentemente de outra maneira não se mesclariam. Ficaria uma coisa meio água e meio azeite, cada porção na sua parte do recipiente transparente. Felizmente, a crônica consegue uma boa mistura, uma qualidade que eu considero contribuição valiosa para o mundo atual. Basta caminhar pela cidade e conferir o trabalho cotidiano dos cronistas, a sua abordagem ideal, que não é exclusividade minha, todo cronista tem um pé no coloquialismo e um pé na poesia. Uns são mais coloquiais, outros mais poéticos. Por isso também que a crônica vingou na rede, resgatando um formato consagrado que a mídia impressa descartou por completo. Acho que o gênero crônica está em terreno fértil na internet. Não considero que haja um tom adequado, mas a crônica tem um compromisso verdadeiro com a leveza, com o humor e a poesia. É só ler os autores que se dedicaram e se dedicam ao gênero para perceber, não tem como errar.
A: O cronista necessariamente precisa falar sobre temas que não estão dentro do seu núcleo? No caso do seu livro, como foi? O gênero é um universo que se olha no entorno, fora da sua intimidade?
Marco: Em teoria, o cronista fala do que está mais próximo, do universo que melhor compreende e com o qual se sente mais à vontade. Mas, na prática, preciso dizer: a crônica é um gênero que se deve praticar com constância, o que muito a define é a periodicidade. É através da periodicidade do texto que se cria a ligação fundamental do cronista com a cidade e com o leitor. Não tem de ser semanal, ou quinzenal, ou mensal. Mas alguma periodicidade tem de ter.
A partir do momento em que autor e leitor geram essa periodicidade, certamente em função de uma disciplina que o cronista estabelece consigo, surge a questão do entorno e do núcleo, porque os temas vão surgindo, o cotidiano da cidade vai se impondo como assunto, a sociedade e o corriqueiro, de acordo com o caráter e o talento do escritor, é claro. Não se pode pedir que o autor do olhar sobre as coisas miúdas fale sobre monumentais viagens espaciais. Mas talvez esse mesmo autor consiga imaginar uma vida original e miúda em Marte, quem sabe?
Algo que parte da percepção e da sensibilidade, como sempre. Creio que o cronista não foge disso, sua imaginação é que escapa. Até mais que da própria intimidade. A intimidade do cronista costuma ser reprovável, feita de atos, hesitações e emoções, como a intimidade de um cidadão qualquer entre nós, que se diz talvez feliz.
A: Você fala sobre muitos temas no seu livro. Como você se apropriar deles? Como é esse recorte de falar sobre alguma coisa? É necessário profundidade para falar sobre um tema?
Marco: O tema do cronista varia conforme seu interesse. Cada cronista fala do que prefere, e ao longo do tempo essa relação vai ficando mais clara, até se tornar um fazer que o leitor compreende como um recorte da realidade. Mas há um outro registro: refiro-me principalmente ao aspecto emocional da crônica, que determina em grande parte e no fundo esse recorte. Não é tanto sobre apropriação, porque a crônica não busca esse recorte através do olhar objetivo, tentando estabelecer uma verdade, ou mesmo uma versão, isso seria aproximá-la do jornalismo ou do artigo de opinião, que prevalecem hoje. O cronista se salva dessa posição de pretensa neutralidade jornalística através do que lhe é subjetivo, esta é a sua profundidade. Trata-se de uma posição radical, eu penso. Mas não tem como ser diferente, a subjetividade é a companheira do cronista. Sem ela, o cronista não faz crônica, corre o sério risco de dizer a verdade, cria artigo. Nada contra o artigo, mas o assunto aqui é a crônica.
A: Fale-me um pouco de como está sendo a divulgação do livro e já tem data marcada para o lançamento.
Marco: O lançamento será no dia 05 de abril, uma quinta-feira, na Livraria da Travessa de Botafogo, a partir das 19 horas. O trabalho de divulgação é conjunto: trabalhamos nisso eu, a Editora Moinhos e a Oasys Cultural. É claro que sou a parte fraca, café com leite, eu mais aprendo do que outra coisa, porém procuro colaborar na forma do autor que apresenta seu trabalho à comunidade da melhor maneira possível. Quero fazer o que puder e for necessário para divulgar esse meu trabalho, e a Oasys Cultural tem me ajudado muito, em várias frentes, desde o uso correto das redes sociais, até assessoria de imprensa e orientação do planejamento. Tem sido um grande aprendizado.