Fotos: Patricia Moura
O festival Hell in Rio foi uma brava empreitada da THC produções de provar que o Rio de Janeiro, onde se reclama muito da falta de programação roqueira, sobretudo metaleira, tem demanda para esse tipo de evento. A cidade maravilhosa, que abrigou o primeiro grande festival de rock da américa Latina, o Rock in Rio, foi perdendo para São Paulo a primazia do showbiz no que diz respeito ao gênero.
O lugar escolhido para abrigar o evento era no mínimo curioso: o Terreirão do Samba, ao lado do sambódromo. Durante o carnaval, o espaço abriga uma programação de samba bem mais barata do que os ingressos do desfile vizinho. Era até engraçado ver os quiosques temáticos, com imagens de figuras lendárias do samba e bandeiras das agremiações estampadas nas pinturas laterais, vendendo camisas de bandas de metal. E não é que o espaço se revelou uma boa opção para eventos desse porte? O tempo é que não ajudou muito. O sábado chuvoso em uma cidade solar, onde um pingo de chuva demove todos da ideia de sair de casa, implicou um público ligeiramente reduzido em relação à capacidade do lugar. As duas primeiras bandas Reckoning Hour e Perc3ption foram prejudicadas pela forte chuva que caía no meio da tarde.
A temperatura realmente subiu com O Satânico Dr Mao e os Espiões Secretos, uma dissidência de um dos maiores nomes do punk nacional, o Garotos Podres. Em 2012, o grupo rachou em dois: de um lado, ficaram Mao e o guitarrista Cacá Saffiotti, que formaram a banda O Satânico Dr. Mao, de outro, Sukata e o baterista Leandro Ferreira, o Caverna, que seguem se autodenominando Garotos Podres, mesmo com o nome da banda em disputa judicial.
A chuva insistia, mas não impediu a empolgação do público, abrindo rodas de pogo. No repertório, músicas da banda com forte temática socialista, como ‘Avante Camarada’ e até uma versão galhofeira do clássico ‘Born To Be Wild’ do Steppenwolf, ‘Nasci Pra Ser Selvagem’. Era inevitável que se lembrasse da antiga banda com clássicos como ‘Garoto Podre’, ‘Johnny’ e ‘Papai Noel Filho da Puta’. A apresentação se encerrou com ‘Repressão Policial’. Ao final, gritos da plateia de “Ei, Bolsonaro! Vai tomar no c”.
A banda seguinte, o Oitão, entrou com a chuva mais branda e plateia mais numerosa. Formado em 2008, o conjunto manteve a temática de cunho social, com músicas como ‘Quarto Mundo’, ‘Faixa de Gaza’ e ‘Podridão Engravatada’. Houve também cover de Ratos de Porão (‘Vida Ruim’) e encerrou com um cover de outro ícone do movimento punk brasileiro, o Olho Seco (‘Olho Seco’).
Na sequência entrou o trash metal dos paulistas do Claustrofobia. Formada em 1994, a banda tem forte influência dos headliners da noite e deram seguimento às críticas sociais com músicas (não faltam motivos no cenário atual) como ‘Pinu da Granada’ e ‘Paulada’. Um show correto, com direito a cover de ‘Children of the Grave’ do Black Sabbath.
O power/speed metal do Hibria foi a sexta atração da noite. Com repertório em inglês e vocais agudíssimos do vocalista Iuri Sanson, a banda de Porto Alegre, formada em 1996, fez um show competente e que prendeu a atenção dos seguidores do gênero, embora muitos na plateia não conhecessem o repertório. Já os capixabas do Dead Fish vieram embalados pelos 25 anos de banda. O quarteto empolgou logo nos primeiros acordes e teve direito até a críticas ao prefeito recém-eleito do Rio, Marcelo Crivella.
A dissidência do Angra, o Almah, foi a penúltima atração do dia. O projeto começou como um trabalho solo paralelo de Edu Falaschi em 2006, na época vocalista do Angra substituto de André Matos, até, em 2008, se constituir como banda em definitivo. Entre os músicos, está o guitarrista Marcelo Barbosa, que também integra o Angra, o headliner do dia seguinte.
O Almah apresentou seu heavy metal tradicional em um show bastante competente, e com toda a técnica apurada que é peculiar ao gênero. E também contou com uma participação especial do atual vocalista do Angra, Fabio Lione em ‘Nova Era’, música do Angra da fase Falaschi.
E a noite se encerrou com eles. Aqueles que como o cicerone do festival, Bruno “Detonator” Sutter, disse ao introduzir a banda “pode perguntar a qualquer estrangeiro se eles conhecem algo de metal brasileiro e advinha qual o nome que eles conhecem?” Foi a deixa para o público que permaneceu fiel até àquela hora (já dava uma da manhã) começar a entoar com todo ar de seus pulmões: “Sepultura! Sepultura!“.
O quarteto formado em Minas Gerais há 32 anos pelos irmãos Max e Igor Cavaleira, composto hoje por Derrick Green (vocais), Eloy Casagrande (bateria), Paulo Jr. (baixo) e Andreas Kisser (guitarra), já entrou com a partida ganha, e empolgou o público durante um pouco mais de uma hora e meia de apresentação. Uma apresentação impecável de uma banda com 30 anos de estrada e fôlego de crianças.
Com um showzaço de estremecer o Terreirão do Samba, como prometia a propaganda do evento, encerrou-se o primeiro dia do festival com saldo mais do que positivo, apesar da chuva.
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