Para uma ideia de missa enquanto liturgia, como se o sagrado estivesse não na ideia de Deus, mas numa relação do homem com o sentimento mais sagrado: o amor. Da ideia da concepção que poderia ser de um novo ser, advindo ao mundo, o cantor, compositor e poeta Lira remodela esta proposta litúrgica para a sexualidade dos contatos, dos afetos apenas no cerne erótico.
Trazer para seu trabalho principalmente na concepção sonora, cravos e coros não é mero capricho estético. Ali, em certas canções como “Para fora da terra”, e “Labirinto e desmantelo” são percepções do cantor e poeta que a linguagem secreta das palavras pode coadunar-se com o sagrado de uma missa que o corpo dos amantes guardam insígnias que são talvez as mesmas de uma ordem ritual religiosa.
Talvez Lira prefira na maioria das letras, corporificar uma poética toda sombreada e metafórica com letras que passam da luz às sombras em poucos espaços do verso. “Senta comigo na mesa e derrama teu corpo em mim”, numa alusão litúrgica do vinho e da hóstia, “tudo que anda perto respira você, lavo com água corrente teu poço de velhos rancores, faço uma nova lembrança no mesmo lugar”.
Lira cria assim, um álbum (i)rotulável, pois se a linguagem dos mistérios de Deus são sempre inescrutáveis, a carne poética do amor humano – (nossa carne) está sempre transida de paixão; de discursos fronteiriços com a nossa vulnerabilidade, e nada melhor que dualizar num álbum de música o confronto corpo \ alma, profano \ sagrado.
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