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“‘Indigo Borboleta Anil’ me colocou em pé. Agora, ‘CAJU’ vai me fazer correr”

Liniker lança seu segundo álbum solo e se consolida como estrela em ascensão da nova música brasileira.

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Liniker na capa do seu disco “Caju”, de 2024.

Não demorou muito para que o novo disco de Liniker passasse a ser comentado nas redes sociais. Apenas um dia depois de ser lançado, em 19 de agosto de 2024, “Caju” já era elogiado por muita gente. Segundo trabalho solo da artista, o álbum chegou ao streaming com o desafio de suceder “Indigo Borboleta Anil” (2021), premiado com um Grammy Latino de melhor disco de MPB. Mas, rapidamente, em menos de 24 horas, os 69 minutos de “Caju” acertaram em cheio os ouvidos dos fãs e chegaram no top 100 Brasil com impressionantes 6 milhões de plays.

Liniker já me chamava atenção pelos shows lotados, pelo protagonismo em festivais, pelas apresentações fora do Brasil e pela atuação consistente como atriz na série audiovisual “Manhãs de Setembro”, de 2021, ao lado de Seu Jorge. Mas agora havia chegado a hora de, efetivamente, ouvir sua música. 

Na verdade, já tinha assistido a alguns vídeos dos primeiros trabalhos dela, como Liniker e os Caramelows, lá em 2015, e havia identificado ali uma promissora cantora  filiada à tradição brasileira de música soul. Mas muita coisa aconteceu desde então no seu desenvolvimento artístico. E o disco que estava agora diante de mim era “Caju”, o mais recente trabalho de uma jovem compositora, que, com menos de 30 anos, havia se tornado imortal da Academia Brasileira de Cultura, assumindo a cadeira de Elza Soares. 

Por isso, meus ouvidos estavam atentos. E logo no início da audição percebi que o conceito central do novo trabalho era propor uma grande conversa entre Liniker e uma personagem chamada Caju, seu alter ego, batizado, assim, com nome de fruta marcadamente brasileira. Como imagem próspera e amorosa da própria artista, “Caju” é resultado do amadurecimento de Liniker no processo de construção do seu amor próprio. “ Eu mereço e quero alcançar tudo o que escrevi ali”, afirma a cantora, narrando seu desejo por um “eterno dia de sol”. 

Quem conduz a gente nessa narração é a palavra escrita transformada em música. Como escritora, Liniker tem muita tinta, e sabe tatuar emoção nas palavras que escreve. Seu texto fala de suas vivências em tom confessional com rara habilidade de comunicação. Como compositora, a artista faz uma sofisticada investigação das suas vulnerabilidades e potências para convertê-las em canções. Curiosamente, “Caju” é um disco escrito a partir do êxito do trabalho anterior, como exercício de autoconhecimento durante um período em que, apesar do sucesso, a artista sentiu muita necessidade de ser humanizada. Como num filme ou numa sessão de análise, “Caju” ajuda Liniker a se sentir amada.

Conduzindo a verdade desse discurso, está o melhor da música na sua impressionante capacidade de comunicar emoção. No álbum encontramos o r&b  dos trabalhos anteriores, mas também o pagode, o jazz, house, a disco, o arrocha e o reggae. Tudo organizado pelos produtores Fejuca e Gustavo Ruiz, assim como acontecera em “Indigo Borboleta Anil”. Apostando em novas possibilidades para um pop brasilero, contemporâneo e arejado, “Caju” apresenta feats de Liniker com Priscila Senna (“Pote de ouro”), Lulu Santos e Pabllo Vittar (“Deixa estar”), Tropkillaz (“So special”), Amaro Freitas e Anavitória (“Ao Teu Lado”), BaianaSystem (“Negona dos Olhos Terríveis”) e Melly (“Papo de Edredom”). 

Em todas as composições, há um mosaico de sons, com múltiplas referências estéticas e espaço para ambiências, em que Liniker performa suas qualidades como cantora. Ela sabe contar a história que está cantando, entre intenções bem sugeridas e vibratos bem colocados. A expressividade da sua música está na sua poesia, certamente, mas também na sua voz, que sobrevoa os sensacionais arranjos orquestrais que costuram o disco. Flertando com o que há de melhor no neo-soul contemporâneo de Daniel Caesar e Childish Gambino, as orquestrações revelam ainda a preciosa participação da Orquestra Jazz Sinfônica em algumas das melhores faixas de “Caju”.

Numa era pós-álbum, em que músicas curtas, no estilo tik tok, dominam as formas de escuta, “Caju” afirma sua identidade pop contradizendo tendências repetitivas, e convidando a gente para um tempo de qualidade ouvindo músicas longas. Gravado todo em fita, o disco nos lembra da beleza das tecnologias analógicas ao mesmo tempo em que conquista seu público ecoando questões contemporâneas. Com “Caju”, Liniker segue pavimentando seu caminho artístico para se tornar uma grande estrela da música brasileira contemporânea.

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Por
Gabriel Gutierrez -

Pesquisador e jornalista interessado na música pop produzida nas Américas.

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