De tempo somos – Sarau do Grupo Galpão tem bela estreia no Teatro Ipanema em sua temporada carioca

Estamos no interior do Brasil, em uma noite sem nuvens, com estrelas e grilos, talvez refletindo sobre o tempo, evocando algo do passado, fazendo planos para o futuro: esse parece ser o clima inicial e sugestivo desse belíssimo De Tempo Somos, o novo espetáculo do Grupo Galpão, que chega ao Rio de Janeiro em linda estreia no Teatro Ipanema e fica apenas quatro dias na cidade, de 25 de setembro a 28 de setembro.

020915_grupogalpao2_divulgacaoO sarau é uma homenagem ao teatro e à música, mas também uma amigável reconciliação com o tempo. Não é inveja, não é recalque, é a mais pura verdade: quem precisa de Rock n’Rio se há Grupo Galpão, com direito a “bis” e a “mais um” ao final, iniciando os trabalhos do fim de semana?

A direção é de Lydia Del Picchia e Simone Ordones, e a direção musical, arranjos e trilha sonora cabem a Luiz Rocha. Esse trio faz miséria conosco: aplausos a eles, que nos brindam com essa costura de 25 canções de espetáculos do grupo, intercaladas com trechos de Jack Kerouac, Anton Tchékhov, Eduardo Galeano, José Saramago, Nelson Rodrigues, Baudelaire, entre outros, amarrados com perfeição e ritmo, além de um humor sutil entre as cenas e as canções, que às vezes são dedicadas a personagens espalhados pelo país e cheios de uma vivência de brasilidade e nostalgia. As histórias desses personagens, resumidas antes da música, são tão inspiradoras quanto as canções que vêm a seguir. O público acompanha batendo palmas, se mexendo na cadeira, balançando a cabeça. Dá vontade de levantar, o espetáculo é mesmo um show.

A preparação vocal, de Babaya, e a preparação corporal, de Fernando Vianna, têm um importantíssimo papel no espetáculo, assim como a iluminação de Rodrigo Marçal. O elenco é um primor: Antonio Edson, Beto Franco, Eduardo Moreira, Fernanda Vianna, Júlio Maciel, Luiz Rocha (ator convidado), Lydia del Picchia, Paulo André, Simone Ordones, Inês Peixoto (atriz curinga). A assessoria na cena “A carteira” é de Diego Bagagal, sendo esta um ponto altíssimo do espetáculo.

Difícil também selecionar, entre todos, as melhores músicas ou os melhores momentos, porque tudo é realmente muito bom, mas ouso escolher A viagem, canção oriental sobre arranjo original de Ernani Maletta, o Canto da Viúva Begbick, de Bertold Brecht, e Panis et Circenses, de Caetano Veloso e Gilberto Gil, também sobre arranjo original de Ernani Maletta. No primeiro e no terceiro, mais especificamente, as lágrimas rondaram os olhos e suas circunvizinhanças.

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Se o tempo é essa substância angustiante que não conseguimos definir, que nos escapa ao mesmo tempo em que nos persegue, que atravessa tudo e se ousa relativo, que não sabemos se o queremos depressa ou devagar, parado ou voando, que é tema de debates filosóficos e de conjecturas psicanalíticas, se nos desperta, o tempo, essa ambivalência avassaladora e se, não poucas vezes, encarna esse insólito horror que nos assusta em parceria com o espelho e talvez com a memória (esta última muito aparentada do espelho), nada melhor do que brindar com ele: há então uma celebração acontecendo em cena, porque, se não é possível dele fugir, juntemo-nos a ele.

O espetáculo,”mais próximo de um sarau literário musical”, é vibrante, cheio de vida, pleno de beleza sonora e visual, mas também leva à reflexão. “Que o tempo passe” e “que passe bem”, é isso o que nos lembra esse afiadíssimo e bem-humorado elenco.

FICHA TÉCNICA DO ESPETÁCULO
Elenco
Antonio Edson
Beto Franco
Eduardo Moreira
Fernanda Vianna
Lydia Del Picchia
Luiz Rocha (ator convidado)
Júlio Maciel
Paulo André
Simone Ordones
*Inês Peixoto (atriz curinga)

Equipe de criação
DIREÇÃO: Lydia Del Picchia e Simone Ordones
DIREÇÃO MUSICAL, ARRANJOS e TRILHA SONORA: Luiz Rocha
PESQUISA DE TEXTO: Eduardo Moreira
FIGURINO: Paulo André
PREPARAÇÃO VOCAL: Babaya
PREPARAÇÃO CORPORAL: Fernanda Vianna
ILUMINAÇÃO: Rodrigo Marçal
DESIGN SONORO: Vinícius Alves
AULAS DE PERCUSSÃO: Sérgio Silva
ASSESSORIA NA CENA “A CARTEIRA”: Diego Bagagal
ASSESSORIA DE ILUMINAÇÃO: Chico Pelúcio
REVISÃO DE TEXTOS: Arildo de Barros
VOZ EM OFF: Teuda Bara

Arranjos baseados em arranjos originais de Babaya, Ernani Maletta e Fernando Muzzi, do repertório musical do Grupo Galpão.

Fragmentos de textos: Eduardo Galeano, Charles Baudelaire, Olga Knipper, Jack Kerouak, Nelson Rodrigues, Anton Tchékhov, José Saramago, Paulo Leminski e Calderón de La Barca

 

 

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