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Quatro perguntas para o escritor André Mellagi

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André Mellagi, nascido em São Paulo, é mestre e doutor em Psicologia Social pelo Instituto de Psicologia da USP. Participou de antologias de contos, além de publicar em sites de literatura (Mallarmargens, Diversos Afins, Revista Gueto). Teve coletânea de contos que recebeu Menção Honrosa em 2014 no Programa Nascente da USP na categoria texto e foi obra pré-selecionada ao Prêmio SESC de Literatura de 2016. Em 2017, seu livro de contos “Bricabraque” foi publicado pela editora Patuá. Fizemos quatro perguntas ao escritor. Confira abaixo.

1) Sua estrutura narrativa é muito interessante. Embora siga uma ação dramática, você trabalha com signos metonímicos que vão fazendo uma espécie de mosaico de uma condição, diria até pós-moderna, do homem contemporâneo. Poderia falar sobre isso?

Talvez por estarmos numa época onde as informações estão mais descentralizadas do que nunca, onde as pessoas ampliam seus meios de comunicação assim como proliferam seus modos de vivência, há um reflexo disso tudo nos contos de Bricabraque. Creio que os signos são reunidos numa espécie de bricolagem para procurar traçar um caminho nas histórias e eles são os mais variados possíveis: desde elementos mitológicos arcaicos até dados tecnológicos atuais. Se não perseguimos mais o caminho único e seguro das tradições, mas reinventamos esse caminho e inserimos novas possibilidades, temos um leque de escolhas que ao mesmo tempo pode ser libertador ou assustador. O personagem principal do conto “Pinhata” é mais ou menos isso: alguém à procura de um destino, mas sempre desviando o caminho para outras possibilidades.

2) O seu livro usa muito a questão da criatividade textual. Como você foi utilizando todo um repertório de informações que são ações bem minuciosas que estão catalogadas durante as narrações do conto?

Em alguns contos tive que fazer algum tipo de pesquisa para dar maior clareza para o que estava apresentando. Se um personagem é farmacêutico ou dentista, tenho que saber um pouco do repertório de suas atividades para trazer ao enredo. Outros contos fazem referência direta com a mitologia, reatualizando o mito no mundo de hoje onde não há mais seres fantásticos ou heróis civilizadores. Ainda assim, creio na potência da narrativa mítica por trazer questões fundamentais do humano que não são ignoradas na modernidade: a questão da vida, da morte, do sofrimento, que vão além da análise descritiva da ciência. Nosso saber secular preocupa-se com o “como”, o mito responde o “porquê”.

3) Você acha que vivemos num mundo meio antecipatório, onde as informações estão embaralhadas como um quebra-cabeça a se formar? E seus contos seriam uma espécie de estudo narrativo disso?

O título do livro, Bricabraque, resume essa dissociação de peças aleatórias de quebra-cabeças diferentes. Como numa loja de quinquilharias onde é possível encontrar de tudo um pouco, há também peças faltando e outras que não se encaixam. A personagem Isaura do conto “Itinerário” não é descrita pelo narrador, mas pela percepção de outros personagens que estão em um ônibus, e sua figura vai sendo tecida através dessas múltiplas impressões, cada uma revelando algum interesse ou peculiaridade íntima, outras até mesmo ignorando sua presença. Parece que temos uma visão multifacetada e incompleta ao mesmo tempo.

4) Há uma riqueza estilística no seu livro. Cada conto tem uma linha evolutiva própria. Como você pensou-os individualmente? Como era cada ponto de desenvolvimento?

Gosto de fazer algumas experimentações e pensar não somente no tema ou no enredo do conto, mas também em sua forma. Estabelecer como as falas dos personagens entram, como os elementos podem dialogar com a ação, criar situações com determinado ritmo. Por exemplo, no conto “Suspensa”, pensei em como o fluxo narrativo poderia acompanhar metas de uma rotina a ser cumprida num ambiente de trabalho que depois é rompido por uma espécie de epifania. Em “Tramas” há um encadeamento de personagens que se ligam por alguma característica própria que afeta o personagem seguinte e por aí vai. “Estarei Aqui” conjuga dois momentos de uma mesma história que se amarram no final. Acho que nisso está o poder criativo e lúdico de escrever, de poder criar e combinar elementos num conto.

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